Fissuras, dor no seio, noites mal dormidas, falta de apoio emocional estão entre os obstáculos que as mães passam na amamentação
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O Agosto Dourado é o mês dedicado à conscientização sobre a importância da amamentação. Todos os anos, fala-se muito dos benefícios do leite materno, da nutrição ideal que oferece ao bebê e da conexão emocional com a mãe. Mas o que pouco se comenta, e precisa ser dito, são os desafios reais e, muitas vezes, dolorosos enfrentados por quem amamenta.
Fissuras, dor, ingurgitamento, pega incorreta, noites mal dormidas e falta de apoio emocional estão entre os obstáculos que muitas mães enfrentam silenciosamente, enquanto tentam manter a amamentação.
“A dor ao amamentar, principalmente no início, não é rara. Fissuras nos mamilos podem surgir quando a pega não está correta, e isso compromete não só a saúde física, mas também o emocional da mulher”, alerta a mastologista Alessandra Amatuzzi, de Curitiba/PR, do CDM – Centro de Doenças da Mama, no Eco Medical Center.
Ela explica que a prevenção e o conhecimento são as melhores maneiras de evitar os desconfortos. As dicas são: hidratar as mamas, evitando cremes na aréola e mamilo, usar um sutiã adequado para amamentação, que não aperte ou machuque as mamas e tenha boa sustentação, aplicar o próprio leite nos mamilos antes e após a mamada, permitir que as mamas sequem ao ar livre e, principalmente, garantir que o bebê abocanhe não só o mamilo, mas a aréola toda. “Corrigir a pega é mais eficaz do que apenas usar pomadas. Isso trata a causa e evita que a dor volte”, reforça.
O leite materno é uma das melhores formas de tratar as fissuras. Conforme a dermatologista Gisele Keiko Machado Shimizu, de Curitiba/PR, ele tem efeito cicatrizante, hidrata e combate bactérias. Pomadas com lanolina pura são úteis nas fissuras mais profundas. Não há necessidade de remover a pomada para amamentar.
Em casos de muita dor, inchaço ou vermelhidão, diz Gisele, podem ser necessárias medicações via oral, tópicas e a terapia com luz local. Não devem ser usadas pomadas com corticoides, perfumes ou álcool.
Conchas e bicos de silicone – O uso de conchas e bicos de silicone, embora populares, requer orientação. “As conchas ajudam o mamilo a não encostar na roupa durante o processo de cicatrização. E os bicos podem ajudar na pega, principalmente nas mulheres com mamilos planos ou invertidos. Mas se mal utilizados, podem criar um ambiente úmido que favorece fungos (cândida mamária) e infecções (mastite). Ambos devem ser lavados com sabão e higienizados a cada amamentação”, destaca a mastologista, explicando ainda que não é aconselhado o desmame total por dor ou fissura. A orientação é adaptar-se e manter a amamentação com uma das mamas enquanto a outra cicatriza.
Não há nada que possa ser feito na gravidez para “fortalecer” a pele e o mamilo, muito menos para “treinar” ou estimular os bicos, como as duchas que antigamente eram indicadas, ou os banhos quentes, demorados e com sabonetes agressivos, orienta a dermatologista. As próprias mudanças hormonais da gestação já preparam o mamilo, aumentando a elasticidade e lubrificação naturalmente.
Leite materno: melhor alimento – A nutricionista materno-infantil Sarina Giongo, também de Curitiba/PR, enfatiza os mitos que atrapalham esse processo. “É comum ouvirmos que leite fraco existe, que o seio pequeno produz pouco leite, que bebê que mama muito chora por fome, ou que mulher com mamilo invertido não consegue amamentar. Nada disso é verdade. Tudo isso desinforma e desmotiva. Cada mãe deve ser acolhida e orientada corretamente”, defende.
Mesmo diante da dor e das dúvidas, os benefícios da amamentação continuam sendo vastos, tanto para o bebê quanto para a mãe. “O leite materno é riquíssimo em fatores imunológicos. Ele protege contra infecções e diarreias, reduz o risco de obesidade, diabetes e alergias. É um alimento completo para os bebês e, ainda, contribui para o desenvolvimento emocional do bebê, graças ao contato visual e afetivo com a mãe”, explica Sarina.
A pediatra Alessandra Vieira, do Eco Medical Center de Curitiba/PR, complementa que os impactos positivos se estendem por toda a infância, até para a vida adulta. Conforme explica, “crianças amamentadas têm menos infecções respiratórias e diarreias, menor risco de alergias e um desenvolvimento cognitivo mais robusto. O contato pele a pele na primeira hora de vida (golden hour), por exemplo, melhora o desenvolvimento da fala, da respiração e até a regulação emocional do bebê”, afirma.
Os dados do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (ENANI), divulgados em 2023, mostram que 45,8% dos bebês brasileiros com menos de seis meses são amamentados exclusivamente. A meta da OMS é atingir 50% até 2025 e 70% até 2030. A amamentação, segundo o Ministério da Saúde, deve ser exclusiva até os 6 meses, e continuar até 2 anos ou mais, com alimentação complementar.
Além dos benefícios ao bebê, a mãe também colhe frutos importantes. Segundo a nutricionista Sarina Giongo, amamentar contribui para a recuperação pós-parto, favorece a perda de peso, atua como método contraceptivo natural nos primeiros meses e reduz o risco de câncer de mama, útero e ovário, além de ser uma forma econômica de alimentar o bebê.
A apojadura é o momento em que o leite “desce” e os seios ficam mais cheios, geralmente 2 a 5 dias após o parto. Isso pode causar ingurgitamento e desconforto. A forma correta de lidar: amamentar em livre demanda (a cada 2 a 3 horas ou quando o bebê sinaliza), usar compressas mornas antes da mamada, ordenhar um pouco antes, se estiver muito cheio, e manter técnicas de pega para esvaziar bem.
Quando a mama não é esvaziada por algum motivo, há o acúmulo de leite e consequente ingurgitamento (empedramento) das mamas, que podem levar à infecção (mastite). Nestes casos, por mais dolorido que seja, é essencial esvaziar as mamas e usar um antibiótico se houver mastite, sob orientação médica.
Para a pediatra Alessandra Vieira, é essencial reforçar: “não existe maternidade perfeita. O caminho da amamentação pode ser difícil, e está tudo bem pedir ajuda. Apoio familiar e orientação profissional fazem toda a diferença”.