O psiquiatra João Marcello Korcsik Lessa: “a pandemia por COVID-19 nos faz conscientes da nossa vulnerabilidade”
Em tempo de isolamento social, em virtude da Covid-19, as pessoas estão mais ansiosas. Como elas podem lidar com esse sentimento que pode ser positivo, em algumas situações, e negativo, em outras? Para saber mais sobre o assunto, o portal Medicina e Saúde entrevistou o Dr. João Marcello Korcsik Lessa, especialista em Neurociências e Comportamento pela UFMG. Ele é médico da Fundação Hemominas e integra o corpo clínico da Casa de Saúde Santa Maria, além de atender em seu consultório.
Primeiramente, o que é ansiedade?
Conceitualmente, medo e ansiedade podem ser considerados estados cerebrais causados por estímulos externos ou internos e que estão subjacentes a um conjunto específico de reações comportamentais, fisiológicas, hormonais e autonômicas mensuráveis. No entanto, o medo caracteriza-se por uma resposta emocional a ameaça iminente real ou percebida, frequentemente associado ao comportamento de luta ou fuga. Já a ansiedade caracteriza-se como um estado emocional associado a antecipação de ameaça futura acompanhada de sensações corporais.
A ansiedade tem um aspecto positivo? Qual?
Do ponto de vista evolutivo e adaptativo, a ansiedade é uma reação importantes para a sobrevivência do indivíduo e da espécie. Esse sentimento permite ao indivíduo antecipar ameaças futuras e, assim, evitá-las.
E o contrário? O negativo seria quando vira patológico? Quando e como isso acontece?
A ansiedade passa a ser considerada patológica quando causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, acadêmico, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. A ruptura entre o normal e o patológico ocorre geralmente devido a uma incapacidade de absorver e lidar com os fatores precipitantes da ansiedade. Importante lembrar que algumas pessoas apresentam maior vulnerabilidade que outras para apresentar a ansiedade na sua forma patológica devido a aspectos genéticos e/ou de história de vida.
Em tempos de pandemia, as pessoas ficam mais ansiosas? Como o confinamento provoca nas pessoas esse sentimento?
A pandemia por COVID-19 se apresenta como um estressor psicológico significativo devido ao cenário de incertezas por ela gerados em diversos aspectos da vida (social, econômico e de integridade), e por nos fazer conscientes da nossa vulnerabilidade. A proximidade inexorável e concreta da morte desperta reações emocionais intensas nas pessoas infectadas e em todos ao seu redor, como tristeza, ansiedade, raiva, solidão, desesperança e impotência. A vivência da finitude através do adoecimento e da morte coloca o ser humano em uma situação de fronteira existencial, exigindo recursos pessoais para o enfrentamento de tal realidade.
Para melhor enfrentamento dessa situação, recomendo rotinas de atividades diárias, o estabelecimento de relações sociais, com os devidos cuidados de proteção individual, e a busca de outras fontes de alegrias e inspirações. Também procurar esperar pelo melhor enquanto nos preparamos para o pior, e, se necessário, buscar o apoio de intervenções comportamentais, como psicoterapias e/ou medicação. Importante enfatizar que não existe saúde mental na condição de isolamento social uma vez que afirmamos nossa existência através da relação com o outro.
Para finalizar, quais os sintomas de alerta?
Pacientes com ansiedade costumam descrever o sintoma como uma sensação desagradável, associado a uma preocupação excessiva com o futuro. As sensações costumam ser descritas na forma de tensão muscular, sensação de vazio no estomago, aperto no peito, batimentos cardíacos acelerados, suores, tremores, formigamentos, boca seca, urgência para urinar e cólica abdominal. Observa-se nesses pacientes uma maior vigilância, sensibilidade e reatividade aos estímulos do meio. Podendo se manifestar associada com ataques de pânico, comportamento esquivo ou preocupação excessiva.