Como uma rejeição na infância reflete no comportamento stalker em relacionamentos?

Psicanalista Ana Lisboa analisa caso de mulher que passou cinco anos perseguindo um médico em Minas Gerais

Imagem: Divulgação

Kawara Welch, de 23 anos, foi presa, recentemente, por passar cinco anos perseguindo um médico em Minas Gerais. A jovem chegou a ligar para ele mais de 500 vezes em um só dia, e cadastrou mais de 2 mil números de telefone após ser bloqueada por ele. Ela também enviava e-mails, o perseguia pelas ruas e ia até o local de trabalho e na casa da vítima. Ele nega o envolvimento. Diante deste caso e de inúmeros outros, até protagonizado também na série Bebê Rena, da Netflix, o que acontece para uma pessoa ter esse comportamento stalker (perseguidor) e se dedicar inteiramente pela vida de outra pessoa?

A psicanalista e terapeuta sistêmica, Ana Lisboa, destaca que esse comportamento está relacionado a uma extrema dependência emocional, na qual a pessoa entra em uma espécie de neurose que projeta no outro aquilo que falta nela ou então que, muitas vezes, buscava nos próprios pais, principalmente, na relação afetiva com a mãe o que ela não teve na primeira infância. “A pessoa, na maioria dos casos, se sente vazia, não consegue viver por si só, tendo essa dependência do outro para viver. Se o outro a valida, se o outro diz que ela está bonita, ela se sente vista, como se a pessoa precisasse dos olhos do outro para se sentir viva e isso é a dependência emocional”, comenta Ana. 

Diante disso, segundo a especialista, a pessoa stalker quer saber de tudo da vida da vítima. Logo ultrapassa a realidade, chegando no ponto de projeção, onde a stalker vai criando histórias, em um transtorno de narrativa e necessita do olhar daquela outra pessoa para, literalmente viver. Então, qualquer ‘pingo’ de atenção que a pessoa receba, ela entra nesse estado de neurose e ultrapassa todos os limites diante da vítima. “Vira uma doença que se chama psicose, chegando no ponto de perseguir a vítima. Ela se machuca, tudo para chamar atenção ou estimular a ideia de que ‘se eu não tenho essa pessoa, não faz mais sentido’. A pessoa que sofre com isso, nessas situações, muitas vezes, revive um trauma de abandono e de rejeição que sofreu na primeira infância”, destaca a psicanalista. 

No caso da Kawara, Ana acredita que a stalker pode ter sido acolhida por algum gesto do médico e sentiu viva de novo, acionando gatilhos dos primeiros movimentos em relação a ele.

Segundo a especialista, diante da ‘rejeição’ da vítima, a stalker quer saber o que ela fez, se ela merece isso, se sente rejeitada e humilhada, aumentando a perseguição e ficando ‘cega’ nessa situação. “Em muitos casos, o problema não é da stalker, não é da vítima, é de uma dor que existe na pessoa de se sentir rejeitada que precisa ser cuidada, senão, outras vítimas vão aparecer e a vida dessa pessoa será rodeada em perseguição e encontrar outra vítima para depender emocionalmente”.

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