O psiquiatra João Marcelo Korcsik Lessa: “a principal causa é o estresse relacionado ao trabalho”
A Síndrome de Burnout ainda não é um transtorno catalogado pelos manuais de Psiquiatria. Apesar de não existir uma definição consistente na literatura do que seja essa patologia, também conhecida por Síndrome da Fadiga Profissional, ela é definida como uma síndrome com característica multidimensional como exaustão, ceticismo e falta de eficácia profissional, que se desenvolve em resposta ao estresse ocupacional excessivo e prolongado.
A exaustão (emocional e física) refere-se a sentimentos de esgotamento, sobrecarga e fadiga. O ceticismo refere-se a um distanciamento afetivo e insensibilidade quanto as relações e atividade ocupacional. O senso reduzido de eficácia envolve uma autoavaliação negativa em relação à capacidade e eficácia geral para o trabalho, bem como um sentimento de inutilidade relacionado à crença de incapacidade de contribuir para atingir objetivos valorizados em seu ambiente de trabalho.
Para saber mais sobre essa síndrome, o Portal Medicina e Saúde entrevistou o Dr João Marcello Korcsik Lessa, médico na Fundação Hemominas e faz parte do corpo clínico da Casa de Saúde Santa Maria. Ele é graduado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e tem especialização em Medicina do Trabalho/Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e em Neurociências e Comportamento/UFMG. Tem também residência médica/Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais, e mestrado em Neurociências pela UFMG.
Dr. João Marcello, qual a origem de nome Burnout?
A origem do termo Burnout vem do significado real da palavra em inglês: Burn (combustível) out (esgotado). Significa exaustão/esgotamento, que, por sua vez, se refere aos sentimentos de esgotamento físico e emocional. O termo demonstra metaforicamente que o trabalhador chegou no limite de sua capacidade funcional por absoluta falta de energia.
Quando começou a se falar nessa síndrome?
O conceito Burnout foi designado pela primeira vez, na década de 70, pelo psiquiatra e psicanalista norte-americano Herbert Freudenberg. Desde então, surgiram diversos estudos que contribuíram para o conceito atual que temos sobre a síndrome de Burnout.
Quais as principais causas?
Sua principal causa é o estresse relacionado ao trabalho. Ele pode ser agravado por práticas inadequadas, incluindo pessoas no poder que impõem responsabilidades pesadas sobre os funcionários, ou que tornam difícil a discussão de problemas vivenciados no ambiente de trabalho. Os principais fatores de risco para os pacientes com síndrome de Burnout são a falta de apoio no trabalho, a má relação interpessoal e o assédio moral. Somado a esse estresse, podemos acrescentar o estilo de vida e traços de personalidade como causas concorrentes para a manifestação dessa síndrome.
Ela atinge mais homens ou mulheres? Por que?
Estudos epidemiológicos têm mostrado maior prevalência da síndrome de Burnout em mulheres jovens, solteiras, com altos níveis de educação e com traços de personalidade do tipo A, que é caracterizado por rigidez de conduta, ambição, impaciência e competitividade. Indivíduos com estas características são considerados suscetíveis ao estresse e a problemas cardíacos. A maior prevalência em mulheres apresenta provável correlação com estressores adicionais ao vivenciado no ambiente de trabalho, decorrente de necessidades prementes da família, como cuidar dos filhos e das atividades domésticas.
Na sua experiência, quais os profissionais mais afetados pela síndrome? Por que?
A síndrome de Burnout apresenta alta prevalência em diferentes atividades ocupacionais, mas os profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, residentes) representam um grupo de maior vulnerabilidade devido ao alto nível de dedicação, empatia para com os pacientes e necessidade de tomada de decisões relacionadas à vida e à saúde dos doentes.
Quais os principais sintomas?
Os sintomas que caracterizam a Síndrome de Burnout costumam se sobrepor aos sintomas de depressão maior ou, em alguns casos, ansiedade e depressão severa, mas ocorrendo em um ambiente ocupacional. A sobreposição de Burnout e depressão tem sido debatida desde o nascimento do construto de Burnout na década de 1970. Em seu artigo inaugural sobre Burnout, Freudenberger (1974) já indicava que ao sofrer de Burnout, “a pessoa olha, age e parece deprimida”. Se o Burnout é uma forma de depressão ou um fenômeno distinto é até hoje objeto de grande controvérsia. No entanto, podemos dividir as principais manifestações considerando a natureza do sintoma como físico: fadiga, esgotamento, cefaleia, alteração do sono, alteração do peso, distúrbios gastrointestinais e agravamento de doenças crônicas existentes, emocional: depressão do humor, cognitivo: sentimento de fracasso ou desilusão, falta de esperança, e comportamental: comportamento aditivo, indiferença nas relações sociais e retraimento social.