Febre maculosa: mortes e o aumento de casos no país 

Por: Willian Barbosa Sales

Biólogo, Doutor em Saúde e Meio Ambiente

Nos últimos dias, estamos sendo bombardeados pela mídia com várias notícias de surtos/casos de doenças infecto contagiosas de cunho zoonótico, que é quando um microrganismo passa de algum animal não humano para um indivíduo humano e consegue vencer suas barreiras imunológicas, estabelecendo uma presença infecciosa, podendo evoluir para doença ou morte – isso é uma zoonose. Temos os registros recentes de mortes no Brasil, por febre maculosa, uma doença infecciosa de cunho zoonótico transmitida pelo carrapato-estrela da espécie Amblyomma cajennense.   

A febre maculosa é uma doença infecciosa, febril aguda e de gravidade variável com elevada taxa de letalidade. Os principais sintomas são febre alta e súbita, cefaleia, hiperemia conjuntival, dor muscular e articular, mal-estar, dores abdominais, vômito, diarreia, exantema. Suas complicações estão relacionadas a presença de edema, anasarca, insuficiência renal, manifestações neurológicas, hemorragias, miocardite, insuficiência respiratória, hipotensão e choque. Se não tratada adequadamente pode evoluir para quadros graves com morte. Todo caso suspeito é de notificação imediata com registro no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). O último levantamento do Ministério da Saúde, que ocorreu entre 2007 a 2021, mostra que foram notificados 36.497 casos de febre maculosa no Brasil, dos quais 7% foram confirmados. Dos 2.545 casos confirmados, 2.538 relataram exposição de risco e 68,5% haviam frequentado ambientes com presença de animais silvestres, ou seja, floresta fechada.   

Os carrapatos, quando infectados pelas bactérias Rickettsia rickettsii ou Rickettsia parkeri, podem transmitir a febre maculosa para humanos, pois este é considerado um reservatório ou hospedeiro natural (organismo vivo que pode abrigar cronicamente o microrganismo em questão). Sendo assim, a transmissão da doença ocorre pela picada do carrapato infectado. A transmissão da bactéria também pode acontecer no momento em que os carrapatos infectados e aderidos à pele forem retirados com as mãos desprotegidas e/ou além do hábito de esmagá-los com as unhas, procedimento que pode expor o indivíduo à hemolinfa dos carrapatos infectados, gerando a transmissão. O período de incubação da doença é de 14 dias, com média de sete dias após a picada do carrapato.  

Os equídeos – como a capivara (Hydrochaeris hydrochaeris), e marsupiais – como o gambá (Didelphis sp.), têm importante participação no ciclo de transmissão da febre maculosa. Estes animais podem ser amplificadores das bactérias riquétsias, assim como transportadores dos carrapatos potencialmente infectados.   

Os principais fatores de risco para febre maculosa são: residir em áreas onde é comum a doença, como locais rurais/florestas, e convivência com cachorros, cavalos e/ou outros animais domésticos que não possuem supervisão de médico veterinário.

O uso de repelentes específicos com o composto químico DEET, especialmente em áreas do corpo desprotegidas por roupas, é essencial para proteção ao frequentar lugares que possa ter a presença do carrapato, como parques, fazendas, trilhas e florestas onde existe a presença de animais silvestres e animais domésticos sem supervisão de médicos veterinários.   

A saúde única explica de forma clara essas infecções ocasionadas pelo desequilíbrio entre a saúde humana, saúde animal e saúde ambiental. Esses surtos de doença estão ligados, um após o outro, ou seja, não estão simplesmente acontecendo conosco, são resultados de ações que nós humanos estamos fazendo com o mundo a nossa volta. As pressões e perturbações ecológicas causadas pelo antropocentrismo estão aproximando via spillover/transbordamento patógenos de animais, cada vez mais em contato com populações humanas, enquanto nossa tecnologia e nossos comportamentos propagam esses microrganismos cada vez de forma mais abrangente e veloz.  

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