Psicanalista Heloisa Mamede, de Belo Horizonte/MG
O modelo patriarcal, ainda prevalecente na sociedade contemporânea, coloca a mulher em uma posição submissa de trabalhos domésticos e o tornar-se mãe, culturalmente falando, é ainda também inerente ao papel feminino, embora tal conceito esteja em mutação. O tabu da virgindade, entrelaçado com a imagem corporal, que trazia para a mulher uma valorização, situando o corpo como objeto de conquista, dando ao conquistador o privilégio de ser o primeiro e único, vem sendo desmistificado.O entregar o corpo para a posse, que representava o encontro da mulher com sua feminilidade, não vem tendo mais sentido.
O mundo contemporâneo questiona esse modelo patriarcal através do qual a representação masculina foi construída, colocando em evidência a questão da idealização da virilidade com a qual o homem tem que se haver perante a mulher atual. Tal questionamento ganhou força a partir do movimento feminista, que produziu grandes transformações culturais. Entre elas, aparece a mudança da visão das mulheres sobre a questão do direito ao próprio corpo.
Acrescenta-se que nas classes de alta renda, as oportunidades de frequentar boas escolas e desenvolver uma identidade adequada, trazem para as adolescentes bons conhecimentos sobre as questões referentes à sua sexualidade.
Particularmente, nas classes de baixa renda, onde ocorrem dificuldades de ter uma educação ampla e, consequente, impossibilidade de ascensão a bens e meio social adequado, o modelo patriarcal ainda prevalece. Em decorrência, durante a adolescência a alienação ao outro e a gravidez resultante, embora inclua sempre uma perda, a mesma é compensada pelo imaginário de expectativas e sonhos de assumir a maternidade e consequente introdução ao mundo do adulto, promovendo, assim, a valorização pessoal.
O sexo casual está na mídia e é apresentado como ferramenta de conquista para assegurar o parceiro ideal. O tornar-se “uma garota popular” também participa desse jogo, pois ser discriminada por não participar da troca de prazeres sexuais provoca a angústia da solidão, podendo levar a um quadro depressivo.
O desafio de não usar o preservativo, pois torna “tudo mais gostoso”, é aceito sem medir as consequências. O desejo feminino de ter um filho impõe-se como uma fantasia a ser vivida de ser mãe-mulher. Porém, a metamorfose do corpo traz um questionamento: eu não sou mais aquela menina. Quem eu sou? O real se impõe mostrando a impossibilidade de completude de um desejo plenamente realizado.
O desamparo aponta para a realidade de incertezas de um futuro sem perspectivas. A convivência com os amigos torna-se estranha, pois de menina-adolescente torna-se mãe-mulher. O sonho se fragmenta e a tarefa de colar os cacos é longa e penosa.