Implantes hormonais: ato da ANVISA contra implantes hormonais vai prejudicar milhares de mulheres
Por Dr. Walter A. P. Pace – Titular da Academia Mineira de Medicina, Professor Doutor em Ginecologia e Coordenador Geral da Pós-Graduação em Ginecologia pela Faculdade de Ciências Médicas MG, mestrado em Reprodução Humana pela Universidade de Paris e doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A publicação da resolução Anvisa nº 3915, de 18 de outubro, que suspende a manipulação, propaganda, comercialização e utilização dos implantes hormonais no país pegou milhares de médicos e pacientes de surpresa.
Da minha parte, trabalho com implantes hormonais há quase 30 anos, com altas taxas de sucesso e baixíssimos índices de efeitos colaterais indesejados. Posso, portanto, atestar pela eficácia desse tratamento médico.
A Anvisa alega que tal medida visa proteger as pacientes do uso indevido e/ou estético dos implantes subcutâneos como via de administração para hormônios. Nesse sentido, a medida de controle do uso indiscriminado e irresponsável de qualquer prática que possa motivar o nome mercadológico de “chip da beleza” é absolutamente necessária. No entanto, não se pode colocar do mesmo lado da balança promessas vãs de juventude eterna e um tratamento médico consolidado e eficaz, que tem sido usado, com sucesso, há mais de 30 anos, para o controle de condições que comprometem a qualidade de vida de milhares de mulheres, como na anticoncepção, no controle e tratamento de doenças hormônio dependentes, como endometriose e miomatose, entre outras, e, ainda, nos casos de carências e desequilíbrios hormonais, como ocorre na menopausa.
Nesse extenso período, não houve relato de efeitos colaterais ou de complicações de maior gravidade relacionados ao uso dos implantes hormonais quando prescritos e usados de forma responsável e comprometida com a saúde das pacientes. Lembrando que a prescrição e manipulação equivocadas podem causar efeitos colaterais, assim como em outras vias de administração como, comprimidos, injeções, gel e cremes, entre outras.
A eficácia dessa terapêutica é reafirmada não apenas por décadas de uso, mas pelas diversas pesquisas e publicações sobre a matéria em revistas indexadas de grande referência no mundo, desde 1960, pelo médico, professor e pesquisador brasileiro Elsimar Coutinho. Desde então, o tema tem sido abordado e pesquisado até a atualidade. Entre os estudos mais recentes está o do médico norte-americano Gary Donovitz, publicado em 2021, sobre o resultado da análise de mais de 1,2 milhão de implantes hormonais que resultou em uma taxa geral de complicações menor que 1%, e sem gravidade nos casos.
Somente nos últimos dois anos, o grupo do brasileiro Dr. Guilherme Renke publicou três artigos em revistas indexadas de alta relevância sobre o uso de implantes hormonais de testosterona, gestrinona e nestorone, que foram visualizados e referendados por mais de 10 mil pesquisadores em todo o mundo. As publicações também estão nas plataformas como PubMed, bastando uma rápida pesquisa pela internet para acessar essa seleção, que vem acompanhada por extensa referência bibliográfica.
É preciso ressaltar que a presente resolução foi antecedida de uma ampla campanha de desinformação feita por sociedades médicas brasileiras, a respeito da via de administração implante subcutâneo, a partir de denúncias realizadas em órgão não oficial – Vigicom Hormônios – sobre suposto mau uso dos hormônios, sem nexo de casualidade e/ou transparência. Nesse processo, falaram até da falta de autorização da Anvisa, o que se tornou realidade apenas no dia 18 de outubro último. Em suma, seguiram a cartilha da mentira e do engano.
Tal prática fere o artigo 52 do capítulo sétimo do Código de Ética Médica, segundo o qual um médico não pode desrespeitar a prescrição ou o tratamento de outro médico, e também a autonomia médica, que garante ao profissional o direito de optar por uma ou outra terapia, a partir das necessidades de cada paciente.
Sempre em defesa do Ato Médico, a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 2.333, de 30/03/2023 ratifica a Resolução CFM nº 1999, de 2012, ao considerar que a administração externa de substâncias que são ou deveriam ser produzidas pelas glândulas do organismo atende a requisitos bem estabelecidos, como carência ou excesso. Essa necessidade deve ser comprovada durante a consulta clínica e atestada por exames laboratoriais específicos.
A entidade condena o uso de anabolizantes para efeitos estéticos ou ganho de performance física, o que não está associado ao tratamento da saúde da mulher.
Ao eliminar esta importante via de administração de hormônios, a Anvisa está privando as mulheres de conquistas importantes, como o tratamento de doenças hormônio dependentes, como a endometriose, por exemplo, que causa dor e sangramento. Por outro lado, contribui para a qualidade de vida com disposição física, libido e melhoria do sono, principalmente quando a mulher chega na menopausa.
Será que a Agência considerou essa dimensão ao aprovar a resolução nº 3815? Entende que muitas das pacientes que optam por esse tratamento o fazem pela falta de outras opções disponibilizadas pela indústria farmacêutica, com a mesma eficácia e segurança?
Termino aqui com um apelo, para que autoridades competentes, profissionais da saúde e da sociedade se mobilizem para rever a resolução 3915, para que a desinformação não vença a ciência.