Novembro Azul: estudo indica aumento de casos de câncer de próstata no mundo

Dr. Wagner Matheus: “apesar da campanha de saúde masculina ser bem difundida, sinto que ainda precisamos avançar para reduzir pensamentos um tanto retrógrados e ainda machistas”

O prognóstico para o câncer de próstata não é nada animador. Estudo conduzido este ano pela Comissão de Câncer de Próstata da revista científica Lancet, uma das publicações de maior fator de impacto no mundo, estima que a doença duplique globalmente no número de casos para 2,9 milhões. Isso reflete um aumento de 85% até 2040.

De acordo com o Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, no Brasil, em 2023, foram registrados 17.093 óbitos devido à doença, ou seja, 47 mortes por dia. Tendo em vista esse cenário preocupante, a Sociedade Brasileira de Urologia de São Paulorealiza mais uma edição da campanha Novembro Azul, alertando para a importância do cuidado com a saúde global masculina, com a realização periódica de exames e consulta com o especialista, o que pode prevenir doenças e até mesmo detectá-las em estágio inicial, quando aumentam as chances de cura, como é o caso do câncer de próstata.

De acordo com a publicação, o grande aumento no número de casos ocorrerá principalmente devido ao aumento da expectativa de vida; de mortes – pelo diagnóstico tardio, comum em países de baixa renda.

“Apesar da campanha de saúde masculina ser bem difundida, sinto que ainda precisamos avançar para reduzir pensamentos um tanto retrógrados e ainda machistas. Não cabe mais piadas e frases que reduzam o tempo de vida do homem. É também de se reconhecer que a comunidade médica urológica se empenha em encontrar maneiras didáticas e originais, que chamem atenção para a importância da prevenção no diagnóstico precoce do câncer de próstata”, alerta o urologista Wagner Eduardo Matheus, atual presidente da Sociedade Brasileira de Urologia – seccional São Paulo. Professor Livre docente da Urooncolgia FCM-UNICAMP.


Estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca) apontam para 71.730 novos casos da doença em 2024, ou seja, 196 por dia. O objetivo é educar a população sobre a importância de exames regulares, especialmente para homens acima de 50 anos (ou 45 anos, se houver histórico familiar da doença).  Outros estudos mostram que, um diagnóstico da doença é feito a cada sete minutos e, um em cada dez homens terá câncer de próstata. Sem suavizar, são dados que mostram a realidade e, que, apesar dos avanços terapêuticos, cerca de 25% dos pacientes com câncer de próstata ainda morrem devido à doença. O câncer de próstata é o segundo tumor mais incidente entre os homens, excetuando-se o de pele.

Incidência: quase 200 casos por dia – O estudo realizado pela Comissão de Câncer de Próstata da revista científica Lancet ressalta que o aumento de casos não pode ser evitado apenas com mudanças no estilo de vida ou intervenções de saúde pública. Os governos precisam preparar estratégias para lidar com essa situação. De acordo com o relatório da Lancet, corroborado pela SBU, para controlar o inevitável crescimento dos casos de câncer de próstata no mundo, quatro pilares são fundamentais:

1 – Diagnóstico: as vias de diagnóstico devem ser modificadas para facilitar a detecção precoce do câncer de próstata e evitar o diagnóstico e tratamento excessivos. Assim, o argumento a favor do rastreamento do câncer de próstata para todos os homens com idade entre 50 e 70 anos (e todos os homens de origem africana com idade entre 45 e 70 anos) nos países de alta renda está se fortalecendo com o uso aprimorado de tecnologias como a ressonância magnética e com a crescente evidência da segurança da vigilância ativa (tratamento para cânceres indolentes, no qual não há intervenção, apenas o acompanhamento da doença).

2 – Incorporação da inteligência artificial na biópsia: os sistemas de inteligência artificial poderiam suplementar os déficits de números e habilidades dos profissionais de saúde, especialmente nos países de baixa renda. Esses sistemas poderiam não apenas diagnosticar cânceres com precisão, mas também subdividir a doença em subgrupos adicionais potencialmente valiosos para ajudar na seleção do tratamento.

3 – Expansão dos serviços de radioterapia e cirurgia: as diretrizes sensíveis aos recursos devem ser implementadas para maximizar o efeito das terapias disponíveis, especialmente a cirurgia e a radioterapia, cujo uso é frequentemente limitado nos países de baixa e média renda.

4 – Pesquisa e desenvolvimento de modelos regulatórios estratificados por risco precisam ser facilitados: novos projetos de ensaios clínicos devem ser apoiados e expandidos. Devem ser aprendidas as lições da forma como os medicamentos de baixo custo para o HIV foram disponibilizados e distribuídos globalmente para assim melhor contemplar também as necessidades de tratamento dos homens com câncer nos países de baixa e média renda, e o que aprendemos com a rápida implementação de estudos de vacinas e terapias como foi contra a Covid-19. É necessária mais investigação sobre como o prognóstico da doença, os resultados e os efeitos do tratamento (e efeitos secundários) diferem em diferentes grupos étnicos e contextos socioeconômicos.

SUS: em 6 anos quase 50 mil cirurgias de retirada da próstata – De acordo com dados do Sistema de Informações Hospitalares (SIH/SUS) do Ministério da Saúde, de 2019 a janeiro a agosto de 2024 foram realizadas 18.315 prostatectomias em oncologia (procedimento para remoção da próstata) e 28.756 prostatovesiculectomias radicais em oncologia (cirurgia para retirar a próstata, tecidos circundantes e vesículas seminais). Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde informam que no ano passado foram registrados 17.093 óbitos devido à doença, o que corresponde a 47 mortes por dia.

Sintomas – Na fase inicial, quando as chances de cura beiram 90%, o câncer de próstata não costuma apresentar sintomas. Apesar de não serem sintomas exclusivos do câncer de próstata, em fases mais avançadas podem surgir:

Tratamentos – As opções de tratamento do câncer de próstata variam de acordo com o estágio, tipo histológico da doença (agressividade das células tumorais), idade, condições clínicas e, também, da decisão compartilhada entre o paciente e o seu médico, podendo incluir cirurgia, radioterapia, vigilância ativa, hormonioterapia, quimioterapia e radiofármacos.

Conforme destaca o Dr. Mauricio Cordeiro, coordenador do Departamento de Uro-Oncologia da SBU, “entre os avanços no tratamento cirúrgico do câncer de próstata estão as cirurgias minimamente invasivas, como a prostatectomia robótica. Essa técnica oferece várias vantagens em comparação ao método tradicional, incluindo menor perda de sangue, recuperação mais rápida no pós-operatório para atividades diárias, menor tempo de hospitalização e redução da dor pós-operatória. A precisão dessa técnica com visualização em 3D e pinças articuladas também permite aos cirurgiões preservar tecidos saudáveis ao redor da próstata, o que gera resultados funcionais mais precoces como a preservação da função sexual e do controle urinário”.  Mas novas abordagens, como a terapia focal (como o HIFU) e a crioterapia, têm permitido tratar a doença localmente em casos selecionados, sem a necessidade de remoção ou irradiação de toda glândula, de forma minimamente invasiva e potencialmente com menos efeitos colaterais.

A terapia focal é indicada para um determinado grupo de pacientes que se enquadrem em requisitos como: tumor de risco intermediário de agressividade, restrito no interior da glândula, que não esteja localmente avançado e com níveis sanguíneos de PSA abaixo de 10 ou 15ng/nl, bem como biópsia positiva nas áreas suspeitas ao exame de ressonância magnética, além de pacientes idosos submetidos à radioterapia e que desenvolveram recidiva, nos quais pode-se empregar a terapia focal de resgate com menos complicações do que a cirurgia de resgate, e, ainda, pode-se evitar o tratamento hormonal desses pacientes.

A tecnologia pode operar com diferentes fontes de energia térmica. Entre as mais empregadas estão a HIFU (High Intensity Focused Ultrasound), que promove aquecimento a partir de ondas de energia acústica que se transformam em energia térmica (65-90º C), e a crioterapia, realizada por congelamento do tumor com gás frio, a cerca de -70º.C.

Nos EUA a terapia focal foi aprovada pela FDA (Food and Drug Administration) em 2015. Atualmente o HIFU e a crioterapia já fazem parte do tratamento do câncer de próstata em países como Reino Unido, Alemanha, França, Bélgica, Itália, Rússia, China, Austrália, Israel, Turquia, Canadá, Japão, além dos EUA. Na Europa o seu uso se iniciou no fim dos anos 1990 e início dos anos 2000. No Brasil, houve o emprego do HIFU por um período (entre 2010 e 2020), porém, a tecnologia ainda está em vias de ser regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).

Apenas 1/3 dos homens acima de 40 anos está muito preocupado com a saúde – Estatisticamente, os homens vivem em média sete anos a menos que as mulheres e não têm o hábito de visitar o médico para um check-up anual. Em 2023, a SBU realizou uma pesquisa sobre a percepção do homem sobre sua saúde que revelou que apenas 32% dos acima de 40 anos se consideravam muito preocupados com a sua própria saúde e que 46% deles só iam ao médico quando sentiam algo. Esse número aumentava para 58% se o homem utilizava apenas o SUS. O estudo foi conduzido com homens acima de 40 anos representantes de todas as regiões do país, via aplicativo mobile pelo Instituto de Pesquisa IDEIA.  A maior proporção dos homens que só vai ao médico ao sentir algo estava no grupo entre 40/44 anos (49%). Já o que mostrou ter maior cuidado com a saúde é o grupo 60+, com 78% respondentes afirmando fazerem exames a cada seis meses ou um ano.

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