Radioterapia: essencial para pacientes com câncer retal localmente avançado
Estudos evidenciam o papel da radioterapia para reduzir o tamanho do tumor, contribuindo inclusive para melhores resultados com a cirurgia. Abordagem possibilita menor toxicidade, melhores taxas de preservação dos órgãos e maior controle local.
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A radioterapia exerce um papel fundamental no tratamento de pacientes com diagnóstico de tumor retal, principalmente quando situado no baixo reto e localmente avançado, ou seja, tumores com estadiamento 2 e 3, que ultrapassaram a camada muscular da parede do reto, ou que têm algum tipo de linfonodo suspeito ou positivo na região próxima ao tumor. A afirmação -baseada em evidências científicas, é da radio-oncologista Isabella Barbosa, membro da Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT) e responsável técnica pelo serviço de Radioterapia do Hospital Meridional Vitória (Kora Saúde).
Entre as referências mais recentes está a revisão internacional e multicêntrica publicada em novembro de 2023, na revista científica Frontiers in Oncology. Neste artigo, os autores avaliaram aspectos relacionados com a terapia neoadjuvante (antes da cirurgia), com destaque para a radioterapia, evidenciando os benefícios desta abordagem para pacientes com câncer de reto localmente avançado.
“O melhor momento para iniciar o tratamento em pacientes com câncer no reto é sempre antes da cirurgia (chamado de neoadjuvante) para tumores localmente avançados, ou seja, tumores T3 e/ou com linfonodos acometidos na região”, pontua Isabella Barbosa.
Em relação aos benefícios, a radio-oncologista cita que a radioterapia apresenta menor toxicidade, melhor taxa de preservação de órgão e maior controle local, contribuindo, inclusive, para melhor resultado cirúrgico.
Expandindo a análise para os tumores colorretais (reto e cólon/intestino grosso), a observação é que para tumores localizados no intestino grosso, normalmente não há indicação de radioterapia, sendo a principal abordagem é a cirurgia associada ou não à quimioterapia.
É possível a radioterapia ser o único tratamento? – De acordo com a radio-oncologista Isabella Barbosa, para alguns casos pode ser possível adotar a radioterapia isolada, num primeiro momento, em um curso curto (short course), de cinco sessões de radiação. Outro protocolo de radioterapia amplamente utilizado, é a de curso longo (long course), em que se faz em 25 a 30 sessões, adotando a quimioterapia junto com a radioterapia.
“Outro cenário, um pouco mais delicado, em que também podemos usar a radioterapia de maneira isolada, é quando o paciente está com sangramento importante ou tumores que estão resultando em muita dor local e que não respondem, de maneira satisfatória, ao tratamento sistêmico. Neste contexto, a radioterapia é adotada de maneira isolada com intuito hemostático, ou seja, visando parar de sangrar, e antálgico, para aliviar a dor do paciente”, detalha a especialista.
Radioterapia associada com quimioterapia pode evitar a cirurgia? – Em casos de câncer no reto são registradas taxas de 20% a 30% de resposta clínica e patológica completa com tratamento neoadjuvante. Quando avaliados com uma nova ressonância, algumas semanas depois do término do tratamento com radioterapia associada à quimioterapia, essa parcela de pacientes não apresenta mais a doença visível nos exames de imagem ou em avaliação clínica do coloproctologista. Isabella Barbosa ressalta que esses pacientes podem ser seguidos clinicamente e periodicamente de perto pela equipe de cuidado oncológico responsável (oncologista/coloproctologista/cirurgião oncológico). Dentro deste contexto, podem não precisar de cirurgia e alcançar a preservação da parte esfincteriana, não sendo necessário a utilização da bolsa de colostomia definitiva.
Radioterapia e quimioterapia – Atualmente, os tratamentos mais utilizados para os tumores localmente avançados de reto são: protocolo de terapia neoadjuvante total, que realiza radioquimioterapia precedida de quimioterapia de indução ou sucedida de quimioterapia de consolidação seguida de cirurgia; ou radioquimioterapia seguida de cirurgia. Contudo, existem inúmeros estudos em andamento avaliando a adição de terapias-alvo e imunoterapia com o objetivo de melhorar os desfechos terapêuticos. “Porém, a conduta atual é de adotar, como tratamento de escolha, a radio e a quimioterapia, com quimioterapia de indução ou consolidação seguido de cirurgia. Certamente, num futuro próximo, teremos dados mais maduros e robustos para avaliar a opção terapêutica da associação de radioterapia com terapia-alvo ou imunoterapia, assim como para outros tipos de tumores, como os de pulmão”, vislumbra Isabella Barbosa.
Radioterapia e metástases – Quando o paciente com câncer colorretal apresenta metástase, um dos principais focos desta enfermidade espalhada é o fígado. A radioterapia é uma opção de tratamento para metástase hepática, vindo de tumores primários retais e intestinais. “Lembrando que, quando tratamos a metástase hepática, é possível realizar a radioterapia estereotáxica fracionada, que é realizada em poucas sessões com doses mais altas por sessão. O intuito do tratamento é agir de maneira radical e ablativa nessas lesões. Para isso, é necessário um mínimo de tecnologia, tanto de planejamento quanto de IGRT, que é a radioterapia guiada por imagem. O IGRT é necessário para avaliar se o alvo está sendo alcançado com segurança no momento das sessões. Infelizmente, esse tipo de tecnologia não está presente em muitos centros de radioterapia do país”, contextualiza a Dra. Isabella.
Gargalos – Na avaliação da especialista, o principal gargalo no tratamento desses tipos de tumor é o tempo, principalmente no Sistema Único de Saúde (SUS), no qual o paciente sofre também com a dificuldade de acesso já a partir do diagnóstico. “Ele tem sintomas, principalmente sangramento retal, mas demora-se muito tempo para ser realizada uma colonoscopia com biópsia. Depois da biópsia, quando há um tumor maligno, esse paciente tem dificuldade aumentada para realizar os exames de estadiamento, como a ressonância de pelve. Como consequência, os pacientes se apresentam ao radio-oncologista com tumores mais avançados, com menos chance de cura. Infelizmente, é muito comum o descumprimento das leis dos 30 e 60 dias”, lamenta. Outro importante gargalo é a não incorporação no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) – e tampouco a ausência de disponibilidade no SUS – da radioterapia de intensidade modulada para pacientes com câncer no reto.