A endocrinologista Rosângela Réa: “episódios de glicemia muito elevada podem ter também graves consequências e devem ser tratados com a devida urgência”
Segundo a Federação Internacional de Diabetes (International Diabetes Federation), o Brasil é o quinto país com maior número de pessoas com diabetes no mundo. São cerca de 17 milhões de pessoas, entre 20 e 79 anos. A doença é silenciosa e pode provocar uma série de complicações.
Para saber um pouco mais sobre ela, o portal Medicina e Saúde entrevistou a Dra. Rosângela Réa, Professora Adjunta e Coordenadora da Unidade de Diabetes do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Hospital de Clínicas da UFPR (SEMPR). Ela também é membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) nos biênios 2000–2001 e 2018-2019.
O que é diabetes?
Diabetes é uma doença que tem como marca a hiperglicemia, ou seja, altos níveis de glicose (ou açúcar) no sangue.
Quem tem diabetes tem dificuldades de o organismo produzir insulina. Por que ela é tão importante assim?
Uma das principais funções da insulina é ajudar a entrada da glicose dentro da célula para produção de energia e realização de atividades celulares, por isso ela é tão importante.
Quem tem diabetes, então, tem excesso de açúcar no sangue?
Exatamente. Com baixa utilização e ainda um excesso de produção, os níveis de glicose ficam elevados no sangue.
Quais as consequências disso?
Níveis altos de glicose, frequentes e/ou mantidos, promovem o endurecimento das artérias (a aterosclerose), além de comprometer órgãos e nervos. Episódios de glicemia muito elevada podem ter também graves consequências e devem ser tratados com a devida urgência.
Quais as causas do diabetes?
O diabetes pode ser causado pela destruição das células do pâncreas que produzem insulina, mediada pelo sistema imunológico do organismo. É o caso do diabetes tipo 1. Mas se você tem diabetes tipo 2, seu corpo nem produz, nem utiliza bem a insulina, embora a deficiência de insulina costuma ser menos acentuada que no tipo 1.
Como o diabetes pode ser classificado?
Além do tipo 1, que geralmente aparece em crianças ou adolescentes jovens, há o tipo 2, diagnosticado com mais frequência em pessoas de meia-idade e mais velhas, embora ambos os tipos possam ocorrer em qualquer idade. São os principais tipos de diabetes. O tipo 2 é o mais comum, em torno de 90% dos casos, mas há também o diabetes gestacional e tipos menos comuns, como o diabetes monogênico, que é uma forma hereditária de diabetes, e o diabetes relacionado à fibrose cística, dentre outros.
Qual é o tratamento? Cada tipo tem um tratamento específico?
Cada tipo de diabetes tem um tratamento específico. Por isso é importante fazer o diagnóstico correto. Pacientes com diabetes tipo 1 costumam necessitar de reposição de insulina desde o diagnóstico, enquanto pacientes com diabetes tipo 2 costumam ser tratados com um ou mais medicamentos orais ou injetáveis (não insulina), nos primeiros anos da doença.
O diabetes tem cura?
Ainda não, mas o importante é que pode ser controlado. Além disso, novos medicamentos e novas estratégias de tratamento têm permitido uma qualidade de vida cada vez melhor para os pacientes.
Há sinais de alerta, quais?
Pacientes com diabetes tipo 2 geralmente não apresentam sintomas, são assintomáticos. Porém, pacientes com diabetes tipo 1 descompensado, com glicemia muito elevada, costumam urinar em excesso (poliúria), tomar muita água (polidíssima) e perder peso, mesmo comendo muito.
Como o diabetes é diagnosticado?
Unicamente através de exames de sangue, ou seja, dosagens da glicemia realizadas em jejum, antes e após a ingesta de um xarope açucarado, ou mesmo ao acaso, sem preparo, na presença de sintomas. Não é possível saber se uma pessoa tem ou não tem diabetes somente através dos sintomas ou fatores de risco.
E quais são esses fatores de risco?
É mais provável que uma pessoa desenvolva diabetes tipo 2 se tiver 45 anos ou mais, com história de diabetes na família, ou se estiver acima do peso. O sedentarismo e certos problemas de saúde, como hipertensão arterial, também aumentam a chance de apresentar diabetes tipo 2. São os chamados fatores de risco. Também é mais provável desenvolver diabetes tipo 2 se a mulher apresentou diabetes durante a gravidez.
Como prevenir essa doença?
Não é possível mudar nossa idade ou o histórico de doenças em nossa família. Mas é possível controlar o peso e aumentar a atividade física, prevenindo ou retardando a instalação do diabetes tipo 2. No caso do diabetes tipo 1, o excesso de peso parece ter um efeito desencadeador também, mas, geralmente, não são identificados fatores de risco nos casos diagnosticados.
Essa doença atinge quantas pessoas no Brasil?
Estima-se que o Brasil tenha cerca de 17 milhões de adultos (entre 20 e 79 anos) convivendo com o diabetes, o equivalente a 11,4% da população nessa faixa etária. Segundo a Federação Internacional de Diabetes (International Diabetes Federativo), o Brasil é o quinto país com maior número de pessoas com diabetes no mundo.
Ela atinge mais homens que mulheres? Por que?
No mundo, o diabetes ainda é discretamente mais frequente nos homens, mas no Brasil as mulheres já são a maioria. Fatores como o diabetes gestacional e menopausa estariam envolvidos nesta maior prevalência.
Qual a faixa etária?
De fato, a prevalência do diabetes varia conforme a faixa etária. Estima-se em 0,1% abaixo dos 30 anos; em 12%, entre 30 e 69 anos (segundo um estudo realizado em Ribeirão Preto), e em 20% – na faixa etária acima de 69 anos. Em ambos os sexos, quanto mais jovem menor o percentual de diagnóstico.
Quando não tratado, quais as consequências?
Com o tempo, a glicemia aumentada, frequentemente em conjunto com a pressão arterial elevada, níveis aumentados de colesterol e triglicerídeos (gorduras) no sangue, e a própria obesidade, podem levar a problemas como infarto, derrame e má circulação nos pés. A doença cardíaca ou doença cardiovascular é a principal causa de morte relacionada ao diabetes. Além disso, a falta de tratamento adequado do diabetes leva à doença renal (neuropatia diabética), problemas nos olhos (retinopatia diabética, catarata, glaucoma), danos aos nervos (neuropatia diabética), problema nos pés, nos dentes e gengivas, dentre outros. Por isso é tão importante levar a sério o tratamento.
Por que o diabetes afeta os rins e pode gerar amputações?
Os níveis elevados de glicose no sangue sobrecarregam os rins, obrigando-os a filtrar muito mais sangue e evoluindo com perda de moléculas de proteína na urina. A perda de sensibilidade pelo comprometimento dos nervos é muito grave por permitir que ferimentos passem despercebidos. Associadas à má circulação pelo “endurecimento das artérias” (aterosclerose), lesões podem se tornar infecções graves e até mesmo levar a amputações de parte dos membros inferiores (dedos, pés, perna), se não forem reconhecidas e tratadas a tempo.
O diabetes pode levar a problemas sexuais? Como tratá-los?
A má circulação e o comprometimento dos nervos, frequentemente associados ao estresse e à ansiedade, podem levar à disfunção erétil ou impotência. O tratamento inclui o uso correto dos medicamentos específicos indicados pelo médico, além de implantes e bombas de vácuo, que podem ser eventualmente indicados. Nesse sentido, é importante citar algumas medidas preventivas, como forma de retardar também as demais complicações crônicas do diabetes, como o controle da glicemia, evitar hábitos sedentários, controlar a pressão arterial, parar de fumar e reduzir o consumo de bebidas alcoólicas. Tais medidas podem colaborar no tratamento do diabetes e na prevenção destas graves complicações. Como se diz: “é melhor prevenir do que remediar”, não é mesmo?
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