Dr. Marcelo Altona: “a luta para que esses jovens ocupem espaços comuns da sociedade, como escolas e de lazer, tem mostrado para todos que pessoas com síndrome de Down podem desenvolver autonomia para aprimorar suas habilidades”
O recente dia 21 de março é conhecido como o Dia Internacional da Síndrome de Down. A data faz referência aos três cromossomos no par 21, o que caracteriza a condição genética. A celebração foi proposta pelo Brasil e aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2011. No país, a estimativa é de que a cada 700 nascimentos, um seja de criança com Down, o que totaliza cerca de 270 mil pessoas com a condição; no mundo, a incidência estimada é de 1 em 1 mil nascidos vivos.
Guilherme Campos é uma dessas pessoas. Com 30 anos, hoje ele é formado em Gastronomia e trabalha como chef de cozinha, por influência da avó e do pai, que também gostam de cozinhar. Ele conheceu a culinária em uma instituição especializada no atendimento a pessoas com síndrome de Down e logo quis se especializar. O jovem se inscreveu no curso de Gastronomia em segredo e a aprovação no vestibular emocionou a família.
Antes das provas práticas, cozinhava o prato várias vezes em casa, para treinar. Porém, em alguns trabalhos em grupo, se sentia ignorado. Apesar da abertura das outras pessoas em “aceitá-lo” no grupo, percebia que suas sugestões não eram ouvidas. “Precisei me fortalecer para não desanimar quando os outros subestimavam minha habilidade. Não deixo mais duvidarem da minha capacidade”, diz Guilherme, destacando que “hoje tenho um emprego com bom salário. Com isso, posso fazer as coisas que gosto com autonomia, como sair com a minha namorada, ir em restaurantes, no cinema, e outros lugares que gostamos. Nós, pessoas com deficiência, precisamos construir autonomia para ter um emprego, uma vida e um futuro independente. Todas as pessoas podem e devem estudar em colégios comuns e fazer uma faculdade da sua escolha”.
Influência e ativismo pela causa – Com 190 mil seguidores no Instagram, Tathi Piancastelli é atriz, escritora, palestrante, ativista e representante da ONU, além de ser influenciadora digital e personagem da Turma da Mônica. Desde a adolescência já pensava em inclusão: ela estudava em uma escola especializada em alunos com síndrome de Down e seu desejo era conviver com crianças diversas, de desenvolvimento típico ou não. “Me incomodava este negócio de especial. Pedi para sair. Queria conviver com todo mundo, fui para uma escola regular. Fiquei muito mais feliz, mudou minha vida”, conta.
A história com as redes sociais começou durante a pandemia, quando ela passou a postar vídeos no Instagram, que viralizaram e a transformaram em influenciadora digital. Hoje ela compartilha seu dia a dia com o marido, Vinícius, que também tem Down (ele é escritor e palestrante), e com a família na internet, além de estrelar campanhas publicitárias na TV e nas redes sociais.
Tathi acha importante esse tipo de conteúdo, pois as pessoas terão mais curiosidade sobre a síndrome de Down e vão procurar saber, o que pode ajudar a diminuir o preconceito. “Nós estamos aqui, somos parte da sociedade”, afirma.
Conforme enfatiza, “as pessoas precisam refletir que não é bom ter preconceito. Se coloque no lugar da pessoa com deficiência, o preconceito tem que ser tirado da sociedade, é preciso respeitar o ritmo de cada um. Respeitar todos que precisam mais de ajuda”.
Os três são embaixadores do Instituto Serendipidade, organização sem fins lucrativos que tem como objetivo acolher e apoiar pessoas com síndrome de Down e suas famílias. Guilherme, Tathi e Vinícius divulgam as iniciativas do Instituto com lugar de fala e têm propriedade para se colocarem como acham certo.
A evolução da expectativa de vida e inclusão – Pessoas com síndrome de Down acabam tendo outras condições de saúde que podem ser críticas, como doenças cardíacas, intestinais e de visão, por exemplo. Esse é um dos motivos para que a expectativa de vida dessa parcela da população seja reduzida em relação à sociedade em geral. “Até a década de 1970, o fator que mais impactava a longevidade das crianças com síndrome de Down eram as cardiopatias congênitas, porque os médicos não tinham coragem de operá-las, já que o risco de mortalidade era altíssimo”, observa o Dr. Marcelo Altona, médico do Grupo Médico Assistencial do Hospital Israelita Albert Einstein (GMA – HIAE), que trabalha no estudo da longevidade com qualidade de vida das pessoas com deficiência.
Estudos específicos relacionados a este grupo têm possibilitado o avanço de técnicas cirúrgicas e outros tratamentos direcionados, o que garante sua longevidade. Até os anos 1940, a expectativa de vida das pessoas com síndrome de Down era de 9 a 12 anos. Já nos anos 1990, essas pessoas viviam até os 35 anos. Hoje, elas já chegam aos 60 anos de idade, de acordo com um artigo publicado no European Journal of Public Health.
A conscientização e a inclusão das pessoas com Down na sociedade têm tido um papel muito importante na evolução da sua saúde. “A luta para que esses jovens ocupem espaços comuns da sociedade, como escolas e espaços de lazer, tem mostrado para todos que pessoas com síndrome de Down existem e podem desenvolver autonomia para aprimorar suas habilidades. Assim, eles têm cada vez mais vontade de viver, o que influencia na busca por um estilo de vida saudável”, diz.
Comprometimento com a geração de valor e impacto social – Três iniciativas fazem parte das frentes de trabalho do Instituto Serendipidade: o Projeto Laços, para o acolhimento das famílias no momento do diagnóstico da síndrome de Down e outras condições genéticas, validando os sentimentos e servindo como rede de apoio para essas famílias; o Programa de Envelhecimento Ativo, que atende gratuitamente adultos e idosos com deficiência intelectual, desenvolvendo programas de bem-estar e contribuindo para o envelhecimento saudável e com protagonismo; e o Programa de Iniciação Esportiva, que tem o objetivo de desenvolver habilidades motoras, sociais e contribuir para o desenvolvimento em todas as fases da vida, estimulando uma infância mais saudável e mais inclusiva através de atividades físicas e esportes.
O instituto acredita que o futuro é hoje, por isso traz sempre o olhar holístico para as potencialidades de cada indivíduo, fazendo com que tenham cada vez mais lugar atuante na sociedade.
De acordo com o fundador do Instituto Serendipidade, Henri Zylberstajn, “houve avanços na inclusão de pessoas com síndrome de Down, mas são muito pequenos perto do que ainda precisa ser feito. Eu sonho com o dia em que vou poder ver a presença das pessoas com deficiência de uma forma mais natural, em cargos de chefia, escolas não negando matrículas, o não abandono por parte de muitos pais quando sabem do diagnóstico, e outros desafios enfrentados. É importante ter esse direcionamento para que as coisas tenham uma chance maior de acontecer. É por isso que eu e toda a equipe do instituto, lutamos”.
O Instituto Serendipidade – Organização sem fins lucrativos que potencializa a inclusão de pessoas com deficiência, com propósito de transformar a sociedade através da inclusão. Visa ser impulsor de impacto social relevante, colaborativo e inovador, sempre prezando pela representatividade, protagonismo, de forma transversal e, acima de tudo, com muito respeito. As iniciativas que atendem diretamente o público são: Programa de Iniciação Esportiva para crianças com síndrome de Down e deficiência intelectual, de famílias de baixa renda; Programa de Envelhecimento – que atende mais de 60 idosos com algum tipo de deficiência intelectual para promoção do bem-estar, e o Projeto Laços – que acolhe famílias que recebem a notícia de que seu filho (a) tem algum tipo de deficiência.
Atualmente o Serendipidade impacta mais de um milhão de pessoas, criando pontes, gerando valor em prol da Inclusão e através do atendimento direto a pessoas com deficiência intelectual e suas famílias.
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