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Para clarear algumas dúvidas de leitores a respeito da “Varíola dos Macacos”, doença que está causando grande preocupação mundial, o Portal Medicina e Saúde entrevistou o médico infectologista Carlos Starling, consultor científico da Sociedade Brasileira de Infectologia, onde ele aborda nessa entrevista, a origem da doença e formas de transmissão, entre outros aspectos. Confira:
Dr. Starling, primeiramente, o que é esta doença?
Monkeypox, ou Varíola dos Macacos, como vem sendo denominada popularmente, é uma doença infecciosa causada pelo vírus Monkeypox, que pertence ao gênero Orthopoxvírus, da família Orthopoxviridae a qual inclui o vírus da Varíola, o vírus da Vaccínia, o vírus Cowpox e o Monkeypox. Após a erradicação da Varíola na década de 80, o vírus Monkeypox emergiu como o mais importante vírus dessa família.
A doença é conhecida na África, mas pela primeira vez chega ao Brasil. De que forma isto aconteceu?
O Monkeypox é uma doença negligenciada, que vem ocorrendo há vários anos na região central no leste da África. Sua incidência foi aumentando progressivamente após a interrupção da vacinação rotineira contra a varíola, uma vez que a vacina da varíola funciona também para a prevenção da Monkeypox.
O nome de Varíola dos Macacos, que talvez não seja o mais adequado, surgiu em função de macacos oriundos de regiões endêmicas da África, terem sido usados em pesquisa na Dinamarca e nos Estados Unidos, animais esses que estavam infectados pelo vírus e causaram a infecção em outros animais e em seres humanos. Usualmente, é um vírus que circula em roedores na África e infecta também macacos que entram em contato com esses roedores em ambiente silvestre. Trata-se portanto de uma Zoonose.
Temos relatos de vários surtos que aconteceram ao longo dessas últimas três/quatro décadas, provocados por animais transferidos de um país para outro de forma legal ou ilegal, o que gerou o aparecimento da doença em zoológicos, como o surto verificado em 2004, no zoológico de Roterdam, na Holanda. Portanto é uma doença que vinha ocorrendo de forma esporádica na Europa e no Estados Unidos, e, agora, passou a circular, de forma mais intensa, principalmente a partir de maio desse ano, em função de migração de pessoas da África para Portugal, Espanha, Inglaterra e, consequentemente, para o restante do planeta. Hoje, mais de 85 países relataram casos da doença, o que vem se transformando em uma emergência de saúde pública internacional segundo a OMS. É através do turismo, viagens de negócios e contato íntimo entre as pessoas que o vírus tem se espalhado pelo mundo.
A transmissão tem semelhança com a da Covid-19? Quais as semelhanças? E o que é diferente?
A transmissão pode se dar de várias maneiras, algumas delas parecidas com a Covid-19, principalmente através de secreção oral, por perdigotos, por via aérea. Mas a principal forma de transmissão é o contato interpessoal e íntimo, que pode se dar por abraço, beijo, convivência na mesma residência e por relações sexuais. Hoje já existem trabalhos mostrando a presença do vírus no sêmen. Lembramos que o ambiente pode ficar contaminado por até 90 horas.
Outra forma de transmissão são as roupas contaminadas, como roupa de cama e roupa pessoal. Pessoas que trabalham em hotéis, lavanderias devem ter cuidado ao entrarem em contato com peças de vestuário ou de cama, ao balançá-las ou estendê-las. Muito cuidado também nos hospitais, devido à contaminação que pode ser feita pelo ar, pelo contato pessoal com os pacientes ou pelos objetos contaminados.
Quais as principais formas de transmissão?
A Monkeypox é uma doença que tem um período de incubação que pode variar de duas a três semanas. Em geral, a grande maioria dos casos se manifesta com aproximadamente 14 dias, mas ela é transmissível por um longo período de tempo, que pode chegar a 4 semanas.
A doença começa com pequenas manchas que se transformam em vesículas, em pústulas, depois secam e ficam em crostras (uma casquinha). Durante todo esse período, todas as lesões são altamente transmissíveis. As pústulas se rompendo, contaminam roupas e o ambiente. Portanto, o cuidado com a roupa de cama e com a roupa pessoal dos infectados é muito importante.
Existe também uma preocupação nos ambientes onde circulam multas pessoas, como ônibus, academias de ginástica, escolas e clubes. Daí, a importância de se fazer um diagnóstico precoce para que as pessoas infectadas sejam isoladas e os cuidados sejam tomados, uma vez que as lesões podem ser leves, com poucas pústulas (menos de 50), moderadas (com mais de 100 pústulas) e graves, com evidência clara e se pode fazer um diagnóstico.
Nesse momento, a maior parte dos casos tem ocorrido na área genital, com lesões penianas, lesões anais, lesões de canal anal e reto (principalmente em homens que fazem sexo com outros homens). Portanto, os urologistas, proctologistas e ginecologistas devem ficar muito atentos para as lesões sugestivas de Monkeypox.
Da mesma forma, as pessoas devem ficar atentas com a limpeza do ambiente, que deve ser feita com hipoclorito de sódio a um 1% e álcool a 70%, com o que já nos ambientamos com a Covid-19, sendo que esse tipo de prevenção serve para as duas doenças.