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Tragédias evitáveis no trânsito podem matar mais do que muitas doenças

Cada acidente representa uma possível lesão cerebral, um trauma medular, uma amputação ou sequelas que acompanharão o paciente por toda a vida. E muitos desses casos poderiam ser evitados com medidas simples”, afirma neurocirurgião.

Foto: Freepik

O Sistema Único de Saúde (SUS) desembolsou R$ 449 milhões em 2024 apenas com internações de vítimas de acidentes de trânsito no Brasil. O dado é resultado de um levantamento inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, baseado nas estatísticas do DataSUS, e revela um custo alarmante que envolve desde atendimentos emergenciais até reabilitação prolongada e fornecimento de órteses e próteses.

Para o neurocirurgião e neurocientista Fernando Gomes, professor livre-docente da FMUSP e médico com mais de 30 anos de atuação no SUS, esse valor é um reflexo direto da negligência histórica em relação à prevenção e à educação no trânsito: “Estamos lidando com tragédias evitáveis que custam vidas e comprometem recursos que poderiam ser aplicados para salvar ainda mais pessoas em outras frentes da saúde pública”, afirma.

O montante gasto em hospitalizações em 2024 seria suficiente para a compra de 1.320 ambulâncias do SAMU — o equivalente a 50 novas unidades por estado. Para efeito de comparação, caso o mesmo investimento dos acidentes fosse revertido à frota, a cobertura do serviço de urgência poderia atingir até 22 milhões de pessoas — quase quatro vezes mais.

Tendo em vista que o custo com acidentes cresce ano a ano, o médico especialista em traumas cranioencefálicos, fala que prevenir acidentes de trânsito não é apenas uma questão de segurança viária, mas de saúde pública. “Cada acidente representa uma possível lesão cerebral, um trauma medular, uma amputação ou sequelas que acompanharão o paciente por toda a vida. E muitos desses casos poderiam ser evitados com medidas simples”, afirma enumerando alguns deles:

1. Cansaço ou estresse extremo – A fadiga e o estresse diminuem a atenção, reduzem o tempo de reação e aumentam as chances de erro. “O cérebro cansado funciona como se estivesse sob efeito de álcool leve. É um risco silencioso”, explica o neurocirurgião.

2. Álcool – Mesmo pequenas doses de álcool comprometem o julgamento e a coordenação motora. “Vejo pacientes que ‘acharam’ que estavam bem para dirigir, mas acabaram vítimas — ou autores — de tragédias”, relata o médico.

3. Celular – A distração ao volante é uma das maiores causas de acidentes. “Ao checar o celular, o motorista retira a atenção do ambiente e o cérebro entra em ‘modo automático’. Isso é fatal em uma fração de segundo.”

4. Velocidade – O corpo humano não foi feito para choques acima de 50 km/h.

Acima dessa quilometragem, qualquer colisão pode ser letal. “O cérebro, por exemplo, pode sofrer deslocamento interno, mesmo com o cinto”, alerta Dr. Fernando.

5. Cadeirinhas e cintos de segurança – Crianças precisam de proteção adequada. “Na prática clínica, vemos que a falta da cadeirinha está diretamente associada a lesões graves ou fatais nos pequenos passageiros.”

Segundo o especialista, o trânsito pode matar mais do que muitas doenças e o custo humano e financeiro dos acidentes precisa entrar com urgência na pauta das políticas públicas. “Por isso, enfatiza, “ações coordenadas de educação, fiscalização e infraestrutura podem não apenas poupar vidas, mas também aliviar a pressão sobre o sistema de saúde”.

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