Dia Mundial do Câncer: no Brasil, câncer de colo do útero, ovário e endométrio respondem por 13% dos casos
Dra. Graziela Zibetti Dal Molin, oncologista: O câncer de colo uterino é uma doença extremamente prevenível e a terceira causa de morte pela doença no Brasil”
Imagem: Dephositos
Segundo o Instituto Nacional de Câncer – INCA, 1 em 5 homens e 1 em 6 mulheres terão câncer em algum momento da vida. Até 2025, o órgão prevê 704 mil novos casos por ano no Brasil. Desses, mais de 32 mil novos casos serão ginecológicos. Por isso, durante o Dia Mundial do Câncer – 4 de fevereiro – conscientizar a população sobre prevenção é a principal missão do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA).
O câncer ginecológico é um dos mais incidentes nas mulheres, sendo que os três órgãos do sistema reprodutor feminino mais acometidos por tumores malignos são os de colo do útero, ovário e corpo do útero (endométrio), que somam 32,1 mil novos casos anuais, conforme afirma o INCA. Este número representa 13,2% de todos os casos de tumores diagnosticados no Brasil, entre a população feminina, excluindo o câncer de pele não melanoma. Do total de brasileiras que recebem, anualmente, o diagnóstico de algum câncer ginecológico, a maioria apresenta tumores de colo do útero: são 17.010 novos casos previstos para 2023. Outros dois tipos, câncer de vulva e vagina, também entram nesse grupo, mas para esses tumores não há dados nacionais oficiais de novos casos/ano
Câncer de colo do útero – Apesar da alta incidência, a doença pode ser evitada. Para isso, é muito importante o acesso e a adesão das mulheres ao exame Papanicolau e à vacinação contra o papilomavírus humano (HPV). Tanto o exame quanto a imunização estão disponíveis na rede pública.
A vice-presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA), Graziela Zibetti Dal Molin, oncologista da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, enfatiza a importância do Dia Mundial do Câncer: “Buscamos divulgar conhecimento e incentivar ações de prevenção para o câncer do colo de útero, como a vacinação contra o HPV. Quando se fala de câncer da mulher, fala-se muito no de mama e pouco do ginecológico. O câncer de colo uterino é uma doença extremamente prevenível e a terceira causa de morte pela doença no Brasil”, alerta.
Vacina contra o HPV – O papilomavírus humano (HPV) é um vírus que pode causar câncer do colo de útero e verrugas genitais. Geram lesões benignas, pré-invasivas ou invasivas, como o câncer de colo do útero (responsável por 99,7% dos casos) e outros tipos de câncer de órgãos genitais. Outro dado aponta que 80% da população sexualmente ativa contrai a infecção pelo HPV pelo menos uma vez na vida.
A vacinação contra o HPV é um dos grandes aliados para o controle dessa doença. No Brasil, o Programa Nacional de Imunização (PNI) disponibiliza gratuitamente a vacinação desde 2014, sendo indicada para meninas e meninos de 9 a 14 anos, pessoas que vivem com HIV e pessoas transplantadas, na faixa etária de 9 a 26 anos. A Sociedade Brasileira de Pediatria, a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) também recomendam a vacinação de mulheres de 9 a 45 anos e homens de 9 a 26 anos, o mais precoce possível.
Mesmo que as vacinas sejam as mais estudadas do ponto de vista de eficácia e segurança, a adesão no Brasil é baixa, longe do ideal de 80% de imunização. Em 2020, 55% das meninas brasileiras de 9 a 14 anos tomaram as duas doses da vacina. Entre os meninos de 11 a 14 anos, a taxa dos que completaram o ciclo vacinal foi de apenas 36,4%. Em razão da baixa adesão às campanhas de vacinação contra HPV e gargalos no acesso ao exame Papanicolau, o Brasil apresenta alta incidência e mortalidade por câncer de colo do útero: 6,5 mil morrem pela doença todos os anos. No mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são mais de 331 mil mulheres mortas em decorrência da doença.
Embora o câncer do colo do útero tenha diminuído em muitas regiões do mundo nas últimas três décadas – particularmente na América Latina, Ásia, Europa Ocidental e América do Norte – os números continuam altos em muitos países de baixa e média renda. Por exemplo, a prevalência de câncer de colo do útero no Rio Grande do Sul – a menor prevalência do país, é de 7,1. Mas em comparação com a Argélia, país de menor IDH, são 7,9 mortes pela doença para cada 100 mil mulheres. O maior impacto da falta de acesso se dá no Comores, quarto menor país africano em área territorial, que registra 38,8 casos para cada 100 mil mulheres. Por lá, cerca de 30% delas tornam-se noivas na infância. Em seguida está a Bolívia, que registra 36,6 casos para cada 100 mil bolivianas.
Saúde pública – Como descrito, o desenvolvimento de programas eficazes de vacinação e triagem contra o HPV tornou o câncer do colo do útero uma doença amplamente evitável. Em 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou uma meta para acelerar a eliminação do câncer do colo do útero como um problema de saúde pública, a fim de reduzir a incidência abaixo do limiar de quatro casos por 100.000 mulheres por ano em todos os países até 2030.
Mesmo com prevenção, uma pesquisa da Fundação do Câncer aponta que 65,8% das mulheres (ou seis em cada 10) com câncer de colo de útero, causado pelo HPV, no Brasil esperam mais de 60 dias para conseguir iniciar o tratamento. Gargalos nas regiões do país apontam diferenças. Por exemplo, o Norte tem o maior número de casos de câncer de colo de útero, com 76 novos casos a cada 100 mil mulheres. Além disso, a região apresenta ainda o maior número de mortes em decorrência da doença em todas as faixas etárias.
Outro dado da pesquisa é que os maiores percentuais da lesão do HPV que pode virar câncer são em mulheres com nenhuma escolaridade ou com ensino fundamental incompleto, com destaque para o Nordeste (55%).Também foi constatado que tanto o câncer em si quanto a lesão precursora da doença acometem mais mulheres negras (pretas e pardas) em quatro das cinco regiões do Brasil, com, respectivamente, 64,3% e 62,7%.
O estudo EVITA do grupo EVA, em parceria com o LACOG, explica os motivos da baixa procura pelo exame Papanicolau: falta de vontade em 46,9%, vergonha ou constrangimento em 19,7%, e falta de conhecimento em 19,7%. Além disso, a pesquisa aponta outras questões como disparidades sociais, menor renda, nível educacional e parceiro estável. Dados estes que reafirmam a importância da conscientização sobre o tratamento precoce.
Em outra pesquisa, a vice-presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA), Graziela Zibetti Dal Molin, está desenvolvendo, junto com o LACOG, o estudo EVITA LATAM, um retrato epidemiológico de câncer de colo do útero que inclui outros países da América Latina para entender a prevalência de vacinação do HPV, as fases da doença e os tipos de tratamento.
Outros tumores ginecológicos – Os tumores ginecológicos se diferenciam quanto aos fatores de risco, bem como local de origem. Se por um lado, o câncer de colo do útero, como já descrito, tem o HPV como fator causal, o câncer do corpo do útero (ou endométrio) vem apresentando crescimento de incidência nos últimos anos, provavelmente por conta da obesidade. Este tumor é responsável por 7.840 novos casos e pela morte de mais de 1800 mulheres/ano no país, e não há um método eficaz para rastreamento.
O câncer de endométrio tem como principal fator de risco a obesidade, mas os principais sintomas são sangramento uterino anormal e desconforto pélvico, que podem alertar à mulher para necessidade de procurar por atendimento médico, havendo, assim, mais chances de diagnóstico e tratamento precoces.
O câncer de ovário, com 7310 novos casos anuais no país, é o terceiro tumor ginecológico mais comum e é o que apresenta a menor taxa de sobrevivência entre os cânceres femininos. “É chamado de tumor silencioso, por não apresentar sintomas específicos e pela ausência de métodos eficazes de rastreamento”, explica o presidente do EVA, Glauco Baiocchi Neto.
Segundo o especialista, alterações genéticas podem estar presentes em 25% das pacientes com esse tipo de tumor e a história familiar de câncer de mama e ovário deve sempre ser sinal de alerta. “Os testes genéticos tornam-se importantes ferramentas não só para definição de tratamento, mas para aconselhamento genético aos familiares”, acrescenta.
Já os cânceres de vulva e vagina são mais raros e também estão associados a infecção por HPV como fator causal. A vacina contra o HPV e o exame ginecológico de rotina são os pilares para prevenção e diagnóstico desses tumores, em fases iniciais.
Conforme estudo recente de membros do grupo EVA, apesar dos avanços em prevenção e tratamento desses tumores, a taxa de mortalidade no Brasil não tem diminuído satisfatoriamente devido a diagnósticos com doença avançada e atraso para início do tratamento.
Sintomas de tumores ginecológicos – Embora muitos tumores se apresentem de forma assintomática, principalmente nos estágios iniciais, a maioria se desenvolve com os seguintes sintomas:
- Sangramento vaginal fora do ciclo menstrual;
- Sangramento vaginal na menopausa;
- Sangramento vaginal após a relação sexual;
- Corrimento vaginal incomum;
- Dor pélvica;
- Dor abdominal;
- Dor nas costas;
- Dor durante a relação sexual;
- Abdômen inchado;
- Necessidade frequente de urinar.
Diagnóstico de câncer ginecológico – Em caso de suspeita de câncer ginecológico, é necessário realizar uma série de exames minuciosos para definir o histórico correto da paciente e chegar ao diagnóstico preciso, tais como:
- Ultrassom;
- Radiografia;
- Tomografia computadorizada;
- Ressonância magnética;
- Tomografia por emissão de pósitrons;
Após esses exames é fundamental que seja feita uma biópsia para confirmar o diagnóstico. Além disso, é essencial avaliar a natureza do tumor. O sistema de estadiamento varia, mas geralmente essas neoplasias são classificadas em quatro níveis diferentes, desde o inicial (Estágio I) até o mais avançado (Estágio VI).
Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA) – O EVA é uma fundação sem fins lucrativos, composta em sua maioria por médicos. A entidade tem como missão o combate ao câncer ginecológico. Seu time, multiprofissional, atua com foco na educação, pesquisa e prevenção, assim como promove apoio e acolhimento às pacientes e aos familiares.
A idealização e a organização do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos foram iniciadas pela oncologista clínica Angélica Nogueira Rodrigues, no Hospital do Câncer II do Instituto Nacional de Câncer (INCA). A primeira reunião ocorreu em 12 de março de 2010 e o nome Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos passou a ser utilizado a partir desta data.
A primeira reunião para nacionalização do grupo ocorreu no Congresso da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), em 2013, na cidade de Brasília. O nome EVA foi resultado de uma reunião neste evento e foi sugerido pela oncologista clínica, coordenadora da área de apoio ao paciente (advocacy) do grupo, Andréa Paiva Gadelha Guimarães. O ginecologista oncológico Glauco Baiocchi Neto é o diretor-presidente do EVA na gestão 2023-2024.