Estilo de vida é apontado como principal causa de câncer em pessoas jovens

Fatores como sedentarismo, aumento do consumo de álcool, tabagismo persistente, obesidade e o consumo excessivo de alimentos ultraprocessados, ricos em sal, açúcar e gorduras são os principais suspeitos de impulsionar este cenário
Foto: Pixabay IA
A incidência de casos de câncer entre pessoas com menos de 50 anos cresceu 79% em três décadas (entre 1990 e 2019). Dados globais recentes confirmam um alarmante aumento da doença em pessoas jovens, na faixa etária de 25 a 49 anos, como mostra o estudo publicado na revista BMJ Oncology e corroborado por outras pesquisas. Embora o câncer ainda seja mais comum em idades mais avançadas, o aumento proporcional nessa faixa etária e o crescimento de quase 30% na mortalidade, no mesmo período, levantam preocupações. Para o Dr. Rui Weschenfelder, coordenador do núcleo de Oncologia Gastrointestinal do Hospital Moinhos de Vento/Porto Alegre/RS, esse crescimento está associado principalmente ao que se chama de estilo de vida ocidental e urbano. Fatores como sedentarismo, aumento do consumo de álcool, tabagismo persistente, obesidade e o consumo excessivo de alimentos ultraprocessados, ricos em sal, açúcar e gorduras são os principais suspeitos de impulsionar este cenário.
Entre os tumores que apresentam maior aumento nessa faixa etária estão as neoplasias de mama, cólon e reto, esôfago, rim, fígado e pâncreas. O câncer colorretal, em particular, teve sua incidência duplicada no cólon e quadruplicada no reto em jovens, sendo fortemente ligado a padrões alimentares e obesidade. Esses hábitos levam à inflamação crônica de baixo grau, que é vista como uma raiz comum para diversas doenças crônicas. “Melhor que tratar é prevenir”, ressalta o médico.
Neste cenário, a Medicina do Estilo de Vida (MEV) surge como uma importante aliada no combate à epidemia de doenças crônicas, incluindo o câncer, através de mudanças saudáveis de comportamento focando em seis pilares principais: dieta saudável, controle do uso de substâncias tóxicas como álcool e tabaco, prática regular de atividade física, garantia de um sono reparador – de 7 a 9 horas por noite –, manejo do estresse e cultivo de vínculos sociais de qualidade.
É importante assinalar que a genética da maioria das pessoas em uma população geral não é determinante. “Noventa por cento das doenças crônicas comuns, como as cardiovasculares e a diabete, estão relacionadas ao estilo de vida. Por isso, a adoção de hábitos saudáveis pode reduzir o risco dessas doenças em até 80% e de câncer em cerca de 35%”, explica Alexander Daudt, oncologista e Liderança Médica do Ambulatório de Medicina de Estilo de Vida e Longevidade Saudável do Hospital Moinhos de Vento.
De modo análogo, integrar a MEV aos cuidados do paciente oncológico pode impactar positivamente na sobrevida, como a atividade física, que isoladamente pode reduzir em 30% o risco de recaída em tumores comuns como de mama, cólon e próstata. Como relata Herbert Miranda, diagnosticado em 2020, que, junto ao tratamento e sessões de radioterapia, recebeu extensas orientações sobre estilo de vida e as colocou em prática. Atividades físicas passaram a ser prioridade na sua rotina, ao lado de cuidados com a saúde mental e uma alimentação mais saudável – reduziu o consumo de doces, gorduras e aumentou a quantidade de frutas e vegetais, por exemplo.
“Quando comecei a fazer essas mudanças, embora difíceis e ver os resultados, fiquei motivado. Comecei a me sentir melhor, a responder melhor ao tratamento e já não me sentia mais tão fragilizado”, recorda. Ao assumir o protagonismo de seus cuidados junto ao seu médico, ele acredita que corroborou para um melhor resultado do tratamento, o qual segue trabalhando enquanto está em remissão, e pratica o seu mais novo hobby: mergulho. “Há seis meses comecei a fazer essa atividade. Desde que o câncer apareceu, eu estou aprendendo a fazer muitas coisas pela primeira vez. Agora eu priorizo o que me faz bem”, ressalta.
Embora as diretrizes de rastreamento sejam historicamente voltadas para faixas etárias mais avançadas, algumas recomendações já foram ajustadas, como a colonoscopia a partir dos 45 anos – inclusive para o SUS – e a mamografia a partir dos 40 – recomendação preliminar nos EUA.
Neste cenário, os especialistas reforçam que dentro da rotina diária, pequenas escolhas no presente podem fazer uma grande diferença no futuro. A conscientização sobre a relação entre estilo de vida e câncer, aliada aos avanços da medicina e ao apoio de equipes multidisciplinares, oferece um caminho para enfrentar esse desafio de saúde pública, transformando o medo em ação e empoderamento.