Testes de Infecções Sexualmente Transmissíveis ainda enfrentam resistência entre casais

“As ISTs dentro de um relacionamento são mais comuns do que se imagina. É importante ter conversas francas sobre testagem, prevenção e uso de preservativos”, afirma especialista.
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Apesar dos avanços na informação e no acesso à saúde, as Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) continuam sendo uma realidade silenciosa entre casais, inclusive os considerados estáveis e monogâmicos. O alerta é da médica infectologista Tassiana Rodrigues, da Santa Casa de São Roque/SP, unidade administrada pelo CEJAM – Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”, em parceria com a prefeitura da cidade.
“As ISTs dentro de um relacionamento são mais comuns do que se imagina. É importante ter conversas francas sobre testagem, prevenção e uso de preservativos”, afirma a especialista.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) reforçam a preocupação: mais de 1 milhão de infecções sexualmente transmissíveis curáveis são adquiridas todos os dias no mundo por pessoas entre 15 e 49 anos.
As ISTs mais frequentes no Brasil e no mundo incluem HPV, herpes genital, sífilis, clamídia, gonorreia e HIV. No caso da sífilis, a taxa de transmissão pode chegar a 60% durante sua fase primária. Essas infecções podem causar sérias consequências para a saúde sexual e reprodutiva, como estigmatização, infertilidade, complicações na gravide e desenvolvimento de câncer
Um dos maiores desafios, de acordo com a infectologista, é o fato de que muitas infecções não apresentam sintomas. “Foi justamente por isso que o termo ‘DST’ (Doença Sexualmente Transmissível) foi substituído por ‘IST’, para deixar claro que a pessoa pode estar infectada e não manifestar sinais clássicos da doença por meses ou até anos”, explica.
Quando os sinais são presentes, Dra. Tassiana destaca que a sífilis pode causar feridas indolores nos genitais, ânus ou boca (na fase primária), evoluir para manchas na pele e febre (fase secundária) e permanecer silenciosa por anos (fase latente).
O HIV, na fase aguda, pode gerar febre, dor de garganta e mal-estar geral. Clamídia e gonorreia costumam provocar corrimento, dor pélvica e ao urinar, enquanto a herpes genital se manifesta com vesículas dolorosas e sensação de queimação. Segundo a médica, algumas infecções, como a sífilis, podem ocorrer novamente mesmo após tratamento.
A infectologista também lembra que algumas ISTs podem ser confundidas com outras condições clínicas. “Lesões genitais podem parecer aftas, psoríase ou até doenças autoimunes, enquanto corrimentos podem ter origem em infecções fúngicas ou irritações não infecciosas. Por isso, o diagnóstico médico é essencial.”
Saúde e relacionamento lado a lado
A profissional reforça que a melhor forma de abordar o tema da testagem em um relacionamento é com empatia e naturalidade. “É fundamental falar abertamente, sem julgamento, explicando que qualquer pessoa sexualmente ativa está sujeita a uma IST. O diagnóstico precoce não apenas evita complicações, como também protege o(a) parceiro(a).”
Ela enfatiza que, em relacionamentos duradouros, o uso do preservativo costuma ser deixado de lado com o tempo. No entanto, a infecção pode surgir mesmo após anos de convivência, seja por relações anteriores ou situações fora da relação. “A testagem deve ser vista como um gesto de cuidado mútuo, não como sinal de desconfiança”, orienta.
Ao identificar uma infecção, a recomendação é que ambos os parceiros realizem a testagem completa, mesmo que o outro não apresente sintomas. Durante o tratamento, é necessário evitar relações sexuais sem proteção, até a liberação médica. “É importante também fazer a testagem para outras ISTs, já que infecções associadas são relativamente comuns”, completa.
Além das orientações clínicas, o impacto emocional do diagnóstico pode ser profundo. “Muitos casais enfrentam sentimento de culpa, medo e desconfiança, o que pode levar até mesmo ao rompimento da relação. Nesses casos, o acompanhamento psicológico é fundamental”, afirma.
Dra. Tassiana Rodrigues esclarece que ainda há muitos mitos em torno das ISTs. Um dos equívocos mais comuns observados no consultório é a crença de que essas infecções atingem apenas determinados grupos, como homens que fazem sexo com homens ou que elas só podem ser transmitidas em relações com penetração. “Sexo oral, anal, o contato com feridas ou fluidos contaminados, tudo isso pode transmitir infecções. É um risco presente em qualquer tipo de prática sexual desprotegida”, complementa.
O preservativo continua sendo uma ferramenta fundamental na prevenção, mas não é o único recurso disponível. Testagens regulares e uso da PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) e da PEP (Profilaxia Pós-Exposição), além da vacinação contra hepatites A e B e HPV, compõem um conjunto importante de medidas de proteção.
Por fim, a especialista ressalta que, diante de uma exposição de risco, é fundamental procurar atendimento médico o quanto antes. O profissional avalia a situação, recomenda testes e inicia, se necessário, a PEP, que deve ser administrada em até 72 horas após o contato.