Fígado no limite: quando o transplante deixa de ser opção e vira única saída

“A gordura no fígado, por exemplo, parece algo simples, mas pode evoluir para inflamação, fibrose, cirrose e até câncer”
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Silencioso, resistente e essencial, o fígado é um dos órgãos mais versáteis do corpo humano. Desempenhando mais de 500 funções vitais como, filtrar toxinas, metabolizar nutrientes e regular substâncias químicas no sangue, infelizmente, costuma emitir sinais de alerta apenas quando já está em colapso, ou seja, o grande perigo das doenças hepáticas é justamente o tempo em que elas se desenvolvem sem causar sintomas. “Quando o paciente procura ajuda, muitas vezes o quadro já é grave, destaca o cirurgião gastrointestinal Lucas Nacif/São Paulo/SP”. Nesses casos, o transplante de fígado se transforma na única chance real de sobrevivência.
De acordo com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), mais de 2.300 transplantes de fígado foram realizados no Brasil em 2023, número expressivo, mas, ainda, insuficiente diante da demanda. Entre as principais causas que levam os pacientes à fila de espera estão a cirrose alcoólica, hepatites virais crônicas (B e C), doenças genéticas como, a deficiência de Alfa-1 antitripsina e a esteato-hepatite não alcoólica (NASH), que está cada vez mais comum devido à chamada síndrome metabólica – uma combinação de obesidade, resistência à insulina, hipertensão e sedentarismo.
Conforme explica o Dr. Lucas Nacif, que é membro titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD), “a gordura no fígado, por exemplo, parece algo simples, mas pode evoluir para inflamação, fibrose, cirrose e até câncer. E isso tudo pode acontecer sem que a pessoa perceba”. Por isso mesmo, alguns sintomas merecem atenção imediata, especialmente em pessoas com fatores de risco. Entre os principais sinais de comprometimento hepático estão:
• Icterícia (amarelamento da pele e dos olhos)
• Inchaço abdominal
• Fadiga intensa
• Alterações cognitivas, como confusão e dificuldade de concentração
• Hematomas frequentes e sangramentos
Diante de qualquer um desses sinais de comprometimento hepático, o ideal é procurar atendimento médico imediatamente, já que o diagnóstico precoce aumenta significativamente as chances de controlar a progressão da doença e evitar a necessidade de um transplante. Ainda assim, a prevenção segue sendo a melhor aliada da saúde do fígado.
Segundo o Dr. Lucas Nacif, algumas medidas fundamentais incluem manter uma alimentação equilibrada – rica em vegetais, grãos e proteínas magras, praticar atividades físicas regularmente e realizar exames periódicos, como ultrassonografia e análises de sangue, para monitoramento contínuo da função hepática.
Em alguns casos, o transplante de fígado se torna a única saída. Isso acontece quando o órgão já não é mais capaz de desempenhar suas funções, mesmo com tratamento clínico. Situações como cirrose em estágio terminal, hepatite fulminante ou câncer hepático que não pode ser removido por cirurgia convencional, são exemplos clássicos.
O procedimento envolve a substituição completa do fígado doente por um saudável, vindo de um doador que pode ser falecido ou, em alguns casos, vivo. O fígado é um dos poucos órgãos com capacidade de regeneração, o que torna possível a doação de parte dele em vida, geralmente entre familiares.
O Brasil conta com o Sistema Nacional de Transplantes (SNT), responsável por organizar a fila de espera e definir critérios para a distribuição dos órgãos, sempre com base em urgência, compatibilidade e tempo de espera. “Infelizmente, muitos pacientes ainda morrem esperando um órgão. Por isso, precisamos falar mais sobre doação. Expressar a vontade em vida e conversar com a família pode ser um gesto simples, mas que salva vidas”, destaca o Dr. Lucas.
O pós-transplante exige cuidados intensivos. Depois da cirurgia, o paciente é monitorado na UTI e, ao longo das semanas seguintes, passa por exames frequentes, acompanhamento com equipe multidisciplinar e uso contínuo de medicamentos imunossupressores — fundamentais para evitar a rejeição do novo órgão.
Com acompanhamento adequado, grande parte dos transplantados volta a ter uma vida ativa e saudável. “O transplante não é o fim da linha, mas, sim, o início de uma nova etapa. Com disciplina e acompanhamento, é possível recuperar a qualidade de vida e reescrever a própria história”, conclui o especialista.