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Vida de médico!: conheça a trajetória do Dr. Walter Pace, um apaixonado pela Medicina

O ginecologista Walter Pace: “para aqueles que pretendem fazer Medicina, digo que têm realmente de gostar muito, pois a profissão é árdua”

Vida de médico não é fácil, principalmente nos tempos atuais. Para entrar na faculdade, o futuro médico tem que estudar muito, deixar de lado o lazer e, em determinadas ocasiões, até o namoro. Obtendo êxito, tem à frente horas e horas de mais estudos, plantões, residência médica, mais especializações e continuar sempre estudando.

Para falar um pouco como é esta vida, o Portal Medicina e Saúde entrevistou um dos grandes nomes da Ginecologia brasileira, o Dr. Walter Pace, Titular da Academia Mineira de Medicina, Professor Doutor Coordenador Geral da Pós-Graduação de Ginecologia Minimamente Invasiva da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Vice-Presidente do PHD Pace Hospital e médico do Centro de Endometriose Santa Joana, em São Paulo.

Ele inicia esse espaço que abordará mais aspectos pessoais do médico, o seu dia a dia, a sua vida atual. Esta entrevista inaugura o espaço “Vida de Médico”.

Inicialmente, Dr. Walter, como foi o seu caminho até alcançar o sucesso profissional?

Comecei bem cedo. Sou de uma família de médicos. Por causa disto, desde sempre mantive estreito contato com a Medicina.

Quando jovem, fiz o primeiro e segundo graus no Colégio Estadual de Minas Gerais, na época referência no ensino. Fiz Medicina na UFMG e Administração de Empresas na Fumec, simultaneamente, assim como, posteriormente, fiz Residência em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Felício Roxo e uma Pós-Graduação em Administração Hospitalar. Ao concluir ambos, prestei concurso e tive êxito na obtenção do título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela FEBRASGO (Federação Brasileira da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia). Em seguida, fiz concurso para o Conselho Nacional de Pesquisa – CNPq, para desenvolver na França, um projeto que daria, naquele momento, o primeiro bebê de proveta do Brasil, tendo como meu orientador o Professor Jean Cohen, um dos pioneiros da técnica na França.

Durante o período de 3 anos que estive na França, fiz Mestrado na Universidade de Paris V, me tornando Professor Assistente Estrangeiro da universidade.

Em Paris, trabalhei com o Professor Raul Palmer considerado o Pai da Laparoscopia no mundo, com quem tive a felicidade de operar e cujo aprendizado e amizade me permitiram trazer esta técnica para o Brasil em 1985.

Através do Professor Jean Cohen conheci o Professor Jacques Hamou, o inventor da Micro Histeroscopia, com quem aprendi a técnica e que me possibilitou trazê-la, em 1985, para o Brasil tornando-me pioneiro no país.

De volta ao Brasil, realizei o primeiro bebê de proveta de Minas Gerais e o 3° do Brasil. Este êxito foi obtido no Hospital Mater Dei, em um trabalho meu, em conjunto com os colegas Henrique Salvador e Ricardo Marinho.

Já em Belo Horizonte, em 1986 prestei concurso para a Faculdade de Ciências Médicas para ser docente. Desde então sou professor na instituição e, há 15 anos, sou também Coordenador Geral da Pós-Graduação de Ginecologia Minimamente Invasiva, tendo formado nesse país mais de 1.000 alunos. Fui Presidente da Federação de Endoscopia e Cirurgia Ginecológica e Obstétrica Brasileira (FEGOB) quando presidi congressos brasileiros. Fiz, ainda, Doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, e, nos anos subsequentes, tornei me Titular da Academia Mineira de Medicina.

Atualmente, sou também vice-presidente do PHD Pace Hospital e Staff do Centro de Endometriose Santa Joana/ São Paulo, referência nacional.

Apesar de todas essas atividades, entre um tempo e outro prático esporte, principalmente corrida. Gosto muito de ler, assistir filmes, ir ao cinema. Participo de algumas confrarias de vinho e de gastronomia.

Meu principal hobby é o futebol. Ou melhor, como costumo dizer aos meus amigos, que de fato gosto mesmo é do Galo, sou completamente fanático e me sinto muito orgulhoso de ser Conselheiro do Clube Atlético Mineiro, não perco um jogo sequer.

Com todo este histórico, o senhor é mesmo apaixonado pela Medicina.

Com certeza! Como disse, sou de uma família de médicos. Desde criança sempre quis ser médico, assistia o sucesso dos meus familiares. Aquilo sempre me encantou. E como sou também rodeado de mulheres, talvez, por isso, quis ser ginecologista. Me fascinava a ideia de colocar vidas no mundo.

Meu grande exemplo foi, sem dúvida, o meu pai Walter Amadeu Pace. Ele vivia a profissão como um sacerdote. Ele adorava a Medicina.

Além dos meus primos, tive também influência da minha mãe, que sempre foi apaixonada pela profissão médica. Assim, escolhi muito precocemente a minha profissão e nunca me desvie do caminho. Sempre tive a convicção de que seria Ginecologista e Obstetra.

Pelo seu relato, a Medicina é uma profissão de desafios. É isso mesmo?

Bom, eu falo que Medicina é um desafio permanente. Fazer Medicina é um caminho muito difícil. Exige bastante sacrifício. É uma profissão que, desde o vestibular, principalmente para uma universidade federal, é preciso estudar muito para obter sucesso. Graças a Deus, passei por esta etapa.

Para mim, os primeiros anos do curso foram muito complicados. Como eu falei, fiz ao mesmo tempo Medicina e Administração. Então, foi um período bastante pesado, mas superei com sucesso.

O desafio seguinte, também muito complicado, entrar na Residência Médica, que é a mesma realidade até hoje. No entanto, naquela época não havia tantas faculdades de Medicina. Em Belo Horizonte tínhamos apenas duas – a Universidade Federal e a Ciências Médicas. No Estado, não deviam ter mais que quatro. Então, fazer Medicina hoje é difícil, mas acho que naquela época ainda era mais difícil.

Após a Residência, outro desafio muito difícil era passar em um concurso para Pós-Graduação no Exterior. Eram poucas vagas e obtive êxito e fui para Paris, com bolsa de estudo pelo governo brasileiro.

Isso tudo poderia ter sido tranquilo, mas não foi, por que nós brasileiros, sofremos sempre muitos preconceitos e, naquela época, entre 1982 a 1985, os preconceitos eram ainda muito maiores. Éramos vistos como subdesenvolvidos e, quando se falava de Brasil, só se falava de Pelé, de mulheres, de samba e de prostituição.

No início, o meu orientador, o professor Jean Cohen, tinha comigo uma conduta bastante grotesca, chegando mesmo a me humilhar, falando que não sabia como eu estava ali, que eu não deveria ser médico. Ele era aquele francês realmente tosco, sem educação e muito bruto. Esse começo foi muito pesado para mim na França, mas foi muito importante para meu amadurecimento.

Para obter respeito e confiança das pessoas no meu trabalho, realmente tive que trabalhar muito. No começo passei maus momentos, mas após algum tempo as coisas começaram a evoluir e ao final eu estava muito bem no serviço, tão bem que o professor Jean Cohen, me convidou para ficar e, alguns anos depois, voltou a insistir para que eu voltasse.

De fato, quando fui para lá, eu era muito jovem. Me formei com 23 anos, com dois anos de Residência, cheguei em Paris com 25 anos, enfim, era muito novo para encarar toda aquela situação.

Enquanto estive lá, fiz também francês pela Sorbonne. Eu precisava muito falar e escrever a língua do país para desenvolver a minha tese.

Quando voltei ao Brasil, também tive que enfrentar as dificuldades inerentes a um profissional que estava retornando, mas não tão grandes como as que enfrentei lá. Se hoje quem vai para fora quando volta as pessoas acham que é a melhor coisa do mundo, que ele é isso e aquilo, naquela época isto era ainda mais valorizado, principalmente porque estava voltado de Paris. Além disso, naquela época, eu tinha uma ligação com o Hospital Mater Dei que abriu as portas para que eu desenvolvesse e implantasse a Endoscopia Ginecológica e o Serviço de Fertilização In Vitro.

Indiscutivelmente, as minhas relações no meu tempo na França e o grande círculo de amizade que desenvolvi em todo Brasil, inclusive nas universidades, abriram muitas portas para mim.

Trabalhar com grandes nomes da medicina mundial facilitou sua vida profissional?

Com certeza! Depois de um período de três anos fora, voltei ainda muito jovem, com 28 anos. O fato de ter ido para a França trabalhar com assuntos e especialidades que até então não existiam aqui, que eram muito incipientes, como Fertilização In Vitro e a Endoscopia Ginecológica, e de ter trabalhado com ícones nestas áreas, sem dúvida, abriram muitas portas para mim. Passei a ter uma grande projeção nacional e internacional, e como ainda tinha vínculo com a França, tive a oportunidade de ser convidado para congressos mundiais.

Apesar de ter aprendido muito medicina e ter sido muito benéfico para a minha progressão na profissão no Brasil, eu aprendi ainda mais de vida na França. Digo isso, porque como sou filho homem e caçula de uma família de Italianos, eu era muito protegido, e o fato de ter morado na França, com todos aqueles preconceitos que já falei, me abriu a cabeça, me amadureceu e acho que me fez virar um homem mais maduro. Foi uma grande escola de vida para mim, todas as dificuldades que encontrei lá.

Após todos esses anos de vida profissional, qual a sua rotina hoje?

Bom, como já disse, sou Professor da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, onde também coordeno a Pós-Graduação de Ginecologia Minimamente Invasiva, atendo consultório particular em Belo Horizonte e em São Paulo, sou Vice-Presidente do PHD Pace Hospital, que construí conjuntamente com minha mãe e minhas irmãs, e, ainda, atendo em São Paulo, no Centro de Endometriose Santa Joana.

Estou agora terminando dois livros na área em que atuo, que é de Ginecologia Minimamente Invasiva, isto é, Vídeo Histeroscopia, Videolaparoscopia e Cirurgia Vaginal.

Outra coisa importante, trabalhei mais de 20 anos com o professor Elsimar Coutinho, Referência Mundial no campo da Reprodução Humana, médico e cientista que lançou a ideia para o mundo que a menstruação é uma sangria inútil. Com ele desenvolvi trabalhos, pesquisas e sou, provavelmente, um dos principais a fazer hoje implantes hormonais no Brasil, que é uma coisa inventada por ele. Após a sua recente morte, que me deixou bastante triste, sou talvez um dos mais atuantes no contexto para levar à frente o trabalho dele, no tocante as suas ideias, inclusive no emprego, na divulgação e nas pesquisas com os Implantes Hormonais, que faço com grande honra e satisfação e que trazem tantos benefícios às mulheres.

Em todos esses anos, como tem sido o apoio de sua família?

Posso dizer que o apoio da minha mãe, do meu pai, da minha mulher e das minhas filhas foi e continua sendo integral. A força é grande e a compreensão também. Viajo muito e estou várias vezes ausente de casa mas, em momento algum, elas me penalizaram ou me cobraram por isso. Pelo contrário, me incentivaram e me incentivam sempre. Nunca pedi às minhas filhas fazerem Medicina. Mesmo assim, espontaneamente, sem qualquer tipo de imposição, das minhas quatro filhas, uma já formou e duas estão fazendo Medicina, inclusive são minhas alunas. São todas encantadas com a profissão. Acho que foram picadas pela mosca, assim como eu. Roberta, minha esposa, apesar de não ser médica, é uma médica de coração. Ela também adora Medicina.

Meu pai, Walter Amadeu Pace, sempre me incentivou, foi um grande exemplo. Com relação a minha mãe, Maria de Lourdes, é só emoção. Ela é uma guerreira. Uma pessoa que deu exemplo a vida inteira. É também uma médica de coração. Influenciou de tal maneira que todos os seus netos (10), com exceção da minha filha mais nova, fizeram Medicina. Não tenho a menor dúvida que isto é papel preponderante dela, ao longo desse tempo. Ela influenciou, orientou, foi um grande exemplo de luta, de trabalho, honestidade, caráter, obstinação e vontade de vencer. Então, ela e meu pai foram o meu Norte, orientando a minha vida. Tenho certeza absoluta que se não fossem meus pais eu não teria chegado aonde cheguei. É uma gratidão imensa.

No tocante à formação médica, quais as diferenças entre o curso de Medicina de sua época e o atual?

São muitas. De fato, mudou demais. Eu enxergo a Medicina da minha época mais romântica. Sinceramente, acredito que os médicos antes eram mais respeitados e tinham uma qualidade de vida melhor do que se tem hoje, que o dinheiro tinha importância, mas não era o mais importante como é hoje. Acho que os médicos antes tinham mais respeito pelos seus colegas.

Hoje, o aluno ao se formar, tem mais visão humanística ou mais mercadológica?

Como são muitos que se formam hoje, a questão mercadológica e o marketing têm um peso completamente diferentes do meu início de carreira. Quando me formei, fazer uma divulgação era uma coisa completamente mal vista. Hoje não, é ao contrário, é um abuso. Pessoas utilizam muito as redes sociais para se projetar e, muitas vezes, de uma forma antiética, até se utilizando de fake news, o que é muito grave, muito feio. Este é o lado negativo da evolução da Medicina. Ao mesmo tempo, com o advento das novas formas de comunicação, ficou também mais fácil a nossa atualização. O estudo para quem pretende estudar ficou mais fácil, o acesso à informação ficou cada vez mais rápido. Este é o lado positivo nessa evolução.

A concorrência é muito grande? Como se destacar?

Sem dúvida a concorrência hoje é muito maior. Como se destacar? Como sempre foi na Medicina e a cada dia mais: a pessoa precisa estudar muito, investir mais e mais em seu aprendizado, se destacar como uma pessoa e naquela área em que atua deve procurar ser um dos melhores. Se entrar em uma Medicina comum terá muitas dificuldades e, acredito, que essas dificuldades vão aumentar ainda mais com o tempo.

Pandemia mudou o comportamento das pessoas com relação aos cuidados com a saúde?

Sim, com certeza. Em tempos de pandemia realmente ocorreram mudanças. Criou-se um pavor tão grande com relação a doença, se fala tanto da doença, que parece que não existem outras doenças. Se a gente observar, hoje não se fala mais de dengue, não se fala mais de câncer, não se fala de endometriose, não se fala mais em acidente vascular, diabetes, não se fala mais de nada. Tem um número grande de pessoas que morre por outras doenças tão importantes, ou mais importantes, e já não se dá importância. Me parece que só existe corona vírus. Eu acho isso muito grave, por que está criando um terror, o que está fazendo com que muitas pessoas não procurem atendimento médico e ao procurarem muitas vezes, é tarde. Acho isso um problema seríssimo.

O que poderia dizer para os jovens colegas que estão no caminho da Medicina?

Para aqueles que pretendem fazer Medicina, digo que têm realmente de gostar muito. Como falei anteriormente, a Medicina é muito árdua, muito difícil. Já era assim no meu tempo e, agora, estou confirmando mais uma vez, apesar de tempos diferentes. Tenho três filhas na Medicina, duas cursando e uma que acabou de formar. Todas estudam muito. A que acabou de formar estudou, lutou e trabalhou arduamente para passar na residência aqui, em Belo Horizonte, e em São Paulo. Ela se esforçou muito o ano todo para passar nas provas e foi aprovada, tendo passado por tudo aquilo que nós, quando queremos fazer medicina, precisamos fazer.

Assim, o conselho que dou é saber de fato se gosta de Medicina, se gostar, deve entrar de corpo e alma por que não tem outro jeito de alcançar o sucesso.

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